14 anos dos atentados de 11 de setembro de 2001.
É um dia complicado pra mim. Mistura muitas emoções e memórias, boas e ruins.
Não é bom lembrar da violência, do pânico, da dor, das mortes do dia.
Também é péssimo pensar nas causas e nos efeitos.
Hoje o mundo é mais preconceituoso, mais racista, mais complexo, mais intolerante, mais pobre e mais inseguro que em 10 de setembro de 2001.
Do outro lado, resta a lembrança do trabalho realizado em meio à incerteza, ao medo, a dor, a dúvida – que era de todos nós. Não sabíamos o que estava acontecendo, nem o que poderia acontecer em alguns minutos, horas, dias – ou 14 anos.
Me restava contar o que via – na TV, na minha janela (a foto que ilustra este post) e na minha frente.
É a primeira vez que eu republico esses sons. Durante esses 14 anos, ficaram nos meus arquivos. O querido Milton Parrom, no seu programa Memória, mostrou o registro algum tempo atrás.
Transmiti ao vivo por quase 12 horas. No meio delas, tivemos que sair correndo do prédio, que ficava pertinho do Pentágono. Foi só um susto. Mais um, porque mais cedo, nós sentimos o impacto. Corri para a janela porque as janelas tremeram. Graças a isso, comecei a relatar o que ocorrida em Washington antes das primeiras imagens.
Foi marcante na minha vida, na minha carreira e na vida de muita gente.
Alguns dias depois de 11 de setembro de 2001, recebi um email (naquela época se usava email…) de um casal que estava com lua-de-mel marcada para a Disney. Queriam saber o que eu achava: se deveriam ir ou não.
Fiquei impressionado com aquilo, alguém confiar em mim para tomar uma decisão tão significativa pra eles. Também me ajudou muito a entender que o tom que usamos para contar as coisas, muitas vezes, tem mais força sobre o ouvinte/leitor/espectador que a mensagem em si. Afinal, eles ficaram preocupados com o “clima”. Não havia nada que indicasse que outros ataques poderiam ocorrer, nem que seriam na Disney.
Passei a me policiar mais nesse aspecto.
Quando se completaram dez anos do ocorrido, eu morava em Maputo, Moçambique, numa outra experiência de ter como obrigação trazer o mundo – um outro mundo, diga-se – mais perto dos brasileiros.
E recebi a mensagem que reproduzo aí embaixo, guardada com muito carinho.
Sinal de que valeu a pena – apesar de, hoje, ver que, para as empresas jornalísticas, no geral, fazer bem o nosso serviço faz pouca diferença.
Mas como se verifica aí embaixo, a gente não sai da memória do destinatário do nosso serviço: quem nos lê, nos vê e nos ouve.
“Prezado jornalista Eduardo Castro:
Meu nome é Edna Guisard Thaumaturgo, viúva, 68 anos, residente em Taubaté-SP,formação acadêmica em História.
Já faz bastante tempo que procuro me informar onde o senhor estaria trabalhando, visto que causou-me grande impressão a sua participação como correspondente nos Estados Unidos durante o episódio de 11/09. Nunca mais ouvi uma reportagem com tanta vibração, que me marcou profundamente pela veracidade e dedicação com que o senhor desenvolveu o seu trabalho jornalístico naquele fatídico dia. Procurei depois de algum tempo me informar sobre o seu trabalho mas foi difícil. Estou feliz de saber que o senhor continua trabalhando, agora em terras da Africa.
Parabéns por ter sabido ouvir a voz de seu coração e ter conseguido passar as informações que tanto marcaram a minha vida, como a de outros milhares de ouvintes assíduos da Radio Bandeirantes AM . Reconheço que estou um pouco atrasada em poder conversar por e mail com o senhor. O tempo passou mas a emoção é a mesma.
Seja feliz com sua família e em sua profissão. O senhor merece.”
” – E aí, Fulano: vitória importante…
– Sem dúvida. Foram três pontos importantes, com um gol no momento importante, com a participação importante de todo o grupo, numa competição importante.
– Fale da importância dessa sequência de bons resultados do Clube do Mé Futebol Clube…
– Importantíssimo. Mas só chegamos a isso graças à participação importante do torcedor, apoiando nos momentos importantes, lotando o estádios em rodadas importantes, nos colocando nessa posição importante na tabela do campeonato.
– E quarta-feira tem um jogo importante…
– Por isso é importante a gente descansar bem amanhã, importantíssimo treinar bem na terça, porque é importante chegarmos bem preparados na próxima rodada.
– Tá aí o Lucas Fulano, jogador importantíssimo em mais uma vitória importante do Clube do Mé”.
É assim: em rádio e TV, nada mais – rá! – importante que o tempo. Então, só fale o que for… importante. Se não tiver importância, não diga.
Se você está dizendo aquilo, é importante – porque você não fala bobagem, não perde tempo com besteira, não enche linguiça.
Não precisa contar por ouvinte/telespectador que aquilo é importante. Se precisa explicar que tal coisa é importante, deve ser porque ela não importa pra ninguém nem pra nada.
Ou você troca a palavra por outra, que realmente informe alguma coisa, ou – melhor ainda – não qualifique, não adjetive. Só conte a importantíssima coisa que o David Fulano fez pelo Clube do Mé Futebol Clube.
Falar de improviso é uma coisa importante, meu caro.
Mas é importante treinar muito antes, no chuveiro, segurando o xampu igual microfone.
Importantíssimo.
A coleguinha Madeleine Lacsko tem trajetória profissional, de certa forma, parecida com a minha: depois de um tempão numa rádio grande de São Paulo (a Jovem Pan, no caso dela), foi pra Brasília, trabalhou em empresa pública (Rádio Justiça) e acabou aqui na África (Angola).
De bebê novinho, voltou para São Paulo, para – certamente – olhar para a cidade e sua gente como nunca dantes.
As referências mudam. O tamanho dos problemas, principalmente.
Aliás – paulistano classemédiaalta querido – pra rever conceitos, abrir a mente, dar mais valor ao que tem, não precisa bater o carro, viver experiência de quase-morte ou falir de maneira irremediável.
É só viajar um pouco – claro, longe do circuitinho Elizabeth Arden, paralelos e adjacências.
É da Madeleine o texto que vai aí embaixo, originariamente publicado no blog Vida de Madá (e o link para ele está aqui)
“A MISS ANGOLA E A VIDA DE MISS
A gente (Carlos Moraes e eu) torceu para a Leila Lopes, mas não só porque ela é linda e sambou na cara das outras.
É que, em Angola, miss é um troço diferente, importante e, ao mesmo tempo, lindo.
Não existe por lá essa figura meio apagada, meio caricata, que a gente mal sabe o nome e trilha essa vida de sub-celebridade, do ar condicionado ao programa de variedades, estampada nas fotinhos menos importantes de coluna social.
Miss Angola é uma pessoa importante para a sociedade do próprio país, que todo mundo conhece, sabe o nome, sabe a cara.
Além disso, é uma moça que põe a mão na massa, põe o pezinho no barro, dá voz a campanhas importantes, usa a própria beleza para fazer a diferença na vida de muita gente que precisa de verdade.
A minha experiência foi com a Miss Angola do ano passado, a Jurema Ferraz, negra com uns olhos de chinesa, uma cara diferente e um jeito de menina.
Eu, no Sambizanga (só quem vive em Luanda entende), ouço que a Miss Angola ia participar da abertura nacional da Campanha de Vacinação contra a Pólio, da qual eu fazia parte.
E aí que eu já pensei que a moça ia dar um puta trabalho, que não ia querer andar na lama, que ia ter frescura com as crianças, a falta de estrutura, a falta de banheiro e tudo mais.
Mas Jurema Ferraz surpreende. Surge de tênis no pé, toda empolgada para vacinar as crianças. Amassa barro, se envereda pelas vielas e, sempre com um sorriso no rosto, beija criança suja, catarrenta, descalça, sem roupa.
Decora algumas coisas sobre a vacina contra a pólio, sorri para as mães, pede que avisem as vizinhas, as parentes, vacina mais crianças, tudo isso com a faixa de Miss Angola no peito.
Não há como negar que a Miss Angola foi importante ali.
E, bem lembrado pelo Kênio Andrade, o episódio em que a mesma moça, sem salto e sem luxo, passou o dia todinho na porta do Belas Shopping, o único de Angola.
São umas 30 lojas, se tanto, um único andar e os melhores cinemas do país. Um supermercado grande, todos os ricos disputando vaga para os carrões praticamente a tapa.
O caso é que ali, na porta, o dia todo, a Miss Angola pedia donativos para montar cestas básicas ou agasalhos para os pobres. Teve sucesso. Depois, com a mesma simplicidade, foi entregar todas as cestas para as pessoas.
A importância da Miss de um país não se faz no concurso, se faz no dia-a-dia, na capacidade que ela tem de usar a própria beleza em prol de algo maior que a beleza.
Sem falar na condição feminina em Angola, tão problemática, tão desigual, capaz de render livros e mais livros sem a gente entender como isso existe.
Angola é um lugar cheio de problemas, mas onde as pessoas são tão bem feitas, de uns corpos tão lindos e umas caras tão desenhadas que, às vezes, a gente nem acredita no que está vendo.
E eu, por ali, mal acreditava que a Miss Angola podia ser algo tão interessante. Por isso a empolgação da gente, esse bando de expatriados, com essa história de Miss Universo.
Ouvinte de rádio tem muita intimidade com os profissionais do veículo. Somos parte da família deles – e eles são parte da nossa vida.
Me lembro que, logo depois do 11 de Setembro, uma noiva preocupada me mandou uma mensagem, relatando que iria casar em pouco tempo e tinha lua de mel marcada para dali alguns dias. Ela queria saber se deveria manter a viagem ou não.
Uma baita responsabilidade…
Acabei sugerindo que ela mantivesse a viagem. Depois, a moça me mandou outra mensagem dizendo que seguiu o conselho, deu tudo certo e ela estava muito feliz. Nunca mais soube do casal, mas espero que a felicidade continue até hoje.
Não há motivos para comemorar o 11 de Setembro: muitas pessoas morreram naquele dia; e muitas mais depois, na prepotente, dispendiosa e desastrada resposta americana. Hoje o mundo é mais inseguro, mais injusto, mais instável, mais preconceituoso, e até mais pobre do que em 10 de Setembro de 2001. Não se faz justiça com vingança. Nem se chega à paz por meio do caminho do lucro.
Mas os dez anos do 11 de Setembro me trouxeram motivos para me emocionar. Recebi várias mensagens de ouvintes, que lembram do meu trabalho em 2001.
Agradeço a todos e cada um deles pelo carinho, como o demonstrado pela ouvinte Edna, que mandou a tocante mensagem que eu republico aqui.
“Prezado jornalista Eduardo Castro:
Meu nome é Edna Guisard Thaumaturgo, viúva, 68 anos, residente em Taubaté-SP,formação acadêmica em História.
Já faz bastante tempo que procuro me informar onde o senhor estaria trabalhando, visto que causou-me grande impressão a sua participação como correspondente nos Estados Unidos durante o episódio de 11/09. Nunca mais ouvi uma reportagem com tanta vibração, que me marcou profundamente pela veracidade e dedicação com que o senhor desenvolveu o seu trabalho jornalístico naquele fatídico dia. Procurei depois de algum tempo me informar sobre o seu trabalho mas foi difícil. Estou feliz de saber que o senhor continua trabalhando, agora em terras da Africa.
Parabéns por ter sabido ouvir a voz de seu coração e ter conseguido passar as informações que tanto marcaram a minha vida, como a de outros milhares de ouvintes assíduos da Radio Bandeirantes AM . Reconheço que estou um pouco atrasada em poder conversar por e mail com o senhor. O tempo passou mas a emoção é a mesma.
Seja feliz com sua família e em sua profissão. O senhor merece.”
Não sei se mereço tanto. Mas agradeço muito, por tanta atenção.
Ps: o post anterior é sobre o 11 de Setembro de 2001. Quem quiser ler – e até ouvir um pouquinho do meu trabalho naquele dia – pode clicar aqui.
Em 11 de setembro de 2001, eu me preparava para sair de casa, em Arlington, estado da Virgínia, e tomar o metrô com destino ao outro lado do Rio Potomac, Washington DC, para a entrevista coletiva que Michael Jordan daria em algumas horas, sobre seu destino profissional. Na época, ele estava no time da cidade, depois de ter voltado de uma breve aposentadoria do basquete da NBA.
Achava que isso – nada além disso – faria daquela manhã histórica.
Quem dera.
Na época, era correspondente nos Estados Unidos para o Grupo Bandeirantes, mas basicamente trabalhava na rádio. Até dez dias antes, 1o de setembro, também trabalhava para a Voz da América. O serviço brasileiro acabara de ser fechado.
Ao terminar de gravar meus boletins, com o telefone ainda na mão, vi, pela TV, a imagem de uma das torres do World Trade Center, em Nova York, a pegar fogo. Em alguns canais, os apresentadores falavam em “small plane” ou algo assim.
Há quase dois anos vivendo nos Estados Unidos, não tinha um programa de preferência nas manhãs informativas. Mas, ao notar que era algo grande, passei para a ABC, captaneada pelo falecido Peter Jennings.
Em meio a um intervalo comercial, o programa Good Morning America é interrompido para a informação em “special report”. Jennings vai assumir a transmissão cerca de 15 minutos depois, exatamente às 9:11 – algarismos que marcariam esse dia.
Pedi para ser passado para o estúdio e entrei ao vivo na Rádio Bandeirantes descrevendo o que via na TV, o que consumiu alguns minutos. Em São Paulo, a produção tentava localizar brasileiros que estivessem em Nova York.
Encontrou Cláudio Maurício Alfredo, ex-colega, na altura trabalhando em um escritório de advocacia. Ele descreveu, emocionado, o segundo choque, na outra torre do World Trade Center.
Alguns minutos depois, em meio às participações que fazia na Rádio Bandeirantes – falando com o colega José Nello Marques – senti o vidro da minha casa tremer. Olhei incrédulo para minha mulher, Sandra, ao meu lado. Eu já estava na Rádio Bandeirantes, Band e Bandnews TV, e ela falava, pelo outro telefone, na TV Gazeta.
Corremos para a outra janela e vimos o Pentágono envolto numa nuvem negra, bem na nossa frente. Dali mesmo, dei a notícia antes das imagens serem difundidas.
A ABC começou a mostrar às 9:42 – sem saber o que era.
Eu já sabia.
Lembro do chefe da redação da Rádio Bandeirantes, João Marcos dos Santos, entrando no meu fone e me perguntando, delicadamente, “Meu velho, sei que você está sob pressão, nervoso, mas tem certeza do que está falando? Aqui não vimos nada ainda…”
Infelizmente, eu tinha.
Minutos depois, a ordem era para fechar os aeroportos e derrubar quem não descesse imediatamente. Mais um pouco e chegava a informação de que outro jato havia caído, em um descampado na Pensilvânia. Poucos dias mais adiante, o relato era de que um grupo de passageiros conseguiu entrar na cabine, lutar com os seqüestradores e derrubar o avião antes que ele seguisse também para Washington.
Por mais que torça para que essa história bonita tenha sido verdade, não consigo acreditar. Se tiver sido mesmo assim, sou grato a esses heróis, pois seria mais um avião a passar sobre meu prédio – como o primeiro.
Mas, para mim, ele foi mesmo abatido.
Mais um pouco, e o inacreditável voltava a acontecer. Primeiro uma, depois outra – as Torres Gêmeas vieram ao chão. Na gravação da rede ABC, Peter Jennings – o melhor âncora que já houve e vai haver, na minha opinião – viu, mas duvidou do que viu (a partir dos 4:20 do vídeo – até ele parar de falar, em choque, aos 6:25).
Fiquei no ar mais de 12 horas seguidas, a maior parte do tempo olhando da janela. Descrevi o que via para a Rádio Bandeirantes, TV BAND, Bandnews TV. Meus relatos também foram transcritos pelo IG.
Fosse no tempo em que trabalhava na Voz da América, jamais teria visto tudo tão de perto. Isso porque, àquela hora, já estaria no centro de Washington, nos prédios da VOA, sem visão do que estaria acontecendo no Pentágono.
Os pomposos “estúdios da Bandeirantes em Washington” (devo confessar) eram o “den” do meu apartamento – um quartinho atrás da porta de entrada, que serve para pendurar casacos e roupas de frio, acarpetado e sem janelas. Silencioso e mais do que suficiente para minhas gravações dali até o fim do ano, quando – já tinha acertado – voltaria para o Brasil.
No meio da tarde, consegui ir a pé até mais perto do Pentágono – que ficava a 5 quadras de onde morava. Mas eram poucas as informações e muito difícil de falar no celular.
Mas fiquei ali o tempo suficiente para sentir o cheiro característico da queda de um avião -algo difícil de descrever, inclusive. Como já tinha participado intensamente da cobertura da queda do avião da TAM em Congonhas, cinco anos antes, não tenho nenhuma dúvida.
Na TV era tanta informação, tanto medo, tanta coisa, que as emissoras começaram a colocar notícias por escrito, com o texto correndo no rodapé da tela – algo hoje comum. Até aquele dia, isso só acontecia nos canais destinados ao noticiário econômico (entram no ar exatamente aos 5:58 deste vídeo abaixo, na CNN).
Anotei o quanto pude – informações, sensações, sentimentos. Está tudo guardado, junto da minha mobília, no Brasil. Um dia, quem sabe, mexo nisso de novo. Também tenho gravada a cobertura ininterrupta que a ABC fez. Dos três dias, tenho dois – 12 e 13 de Setembro – em fitas de vídeo cassete.
O colega Milton Parron, aliás, mexeu nos arquivos da Bandeirantes outro dia, e compôs um belo programa, com um longo trecho do relato que eu e Cláudio fizemos aquele dia, comparando com o também histórico “Guerra dos Mundos” de Orson Welles.
E um outro contemporâneo de Washington, Paulo Moreira Leite – hoje na Época; em 2001 na Gazeta Mercantil – escreveu o texto abaixo, com o qual concordo em 100%.
Eu morava em Washington quando ocorreu o atentado de 11 de setembro. Minha TV estava ligada quando o segundo avião atingiu a segunda torre gêmea no WTC. Acompanhei ao vivo as cenas seguintes.
Tentei chegar ao centro da capital americana mas fui apanhado no contrafluxo de uma multidão de cidadãos que retornavam para suas casas e bloqueavam o transito a dezenas de quilometros de distancia do Pentágono, onde caira um terceiro avião.
Como a maioria das pessoas que viviam nos EUA, fiquei com marcas profundas em função do episódio. Quando você está perto de um ataque dessa envergadura, torna-se, queria ou não, uma vítima potencial. Qualquer que seja sua opinião sobre o governo americano, sobre os direitos humanos e sobre o terrorismo, seu julgamento é influenciado pelo angulo de visão, digamos assim.
Uma década depois, a maioria das análises sobre o 11 de setembro aponta suas responsabilidades para a organização terrorista Al Qaeda e seu líder, Osama Bin Laden.
Mas apesar de morar em Washington e ter até conhecido pessoas que perderam parentes no atentado, eu acho que o presidente americano George W. Bush tem uma grande responsabilidade pelo que ocorreu a partir de 12 de setembro e isso não é pouco.
Feito o balanço da obra de um contra a de outro, pode-se apontar muitas diferenças importantes. Mas é difícil dizer, claramente, quem causou maior prejuizo aos homens e mulheres de nosso tempo.
Se Bin Laden organizou um massacre criminoso de inocentes, Bush tomou diversas decisões erradas e injustificáveis. Agiu como aquela autoridade que aceita a provocação do inimigo — em vez de respondê-la com mais eficácia, com seus próprios meios,em nome de interesses e valores claramente definidos.
Não consigo apontar, depois do 11 de setembro, um único aspecto da vida da humanidade que tenha ficado melhor graças a intervenção do ex-presidente americano.
Bush tentou usar a chamada guerra permanente ao terrror como instrumento fácil de ganhar popularidade.
Admito que a reação de Bush ao atentado pode ter tido como origem a necessidade legítima de dar uma resposta a um atentado que matou milhares de cidadãos americanos, o que colocava obviamente a necessidade de elevar a segurança do país e de seus moradores. Mas Bush tomou iniciativas erradas, com o foco deslocado e com finalidades distorcidas, que se mostraram nocivas a longo prazo. Deu inícío a uma guerra que não poderia ser vencida no Afeganistão. Iniciou outra, no Iraque, com base numa mentira interesseira. Assumiu uma postura tolerante com a tortura de prisioneiros. O saldo é que a hostilidade aos EUA só aumentou ao longo do tempo. Os atentados sangrentos de Londres e Madri encarregaram-se de mostrar que a segurança também diminuiu.
Ao investir 4 trilhões de dolaresa numa aventura militar sem retorno possível, Bush abriu as portas para a grande crise de hoje, quando a potencia número 1 do planeta tornou-se um transatlântico à deriva e carrega boa parte do mundo desenvolvido consigo.
Bush mostrou-se incapaz de dar uma resposta política a qualquer problema sério dos países árabes e do Oriente Médio, causa original dos ataques. Sempre tentou respostas no plano militar e fracassou sempre.
Se a vida no Oriente Médio pode melhorar, daqui para a frente, deve-se a uma atuação corajosa da população árabe que, sem ajuda dos EUA nem da Al Qaeda, muitas vezes apenas hostilizada por ambos, colocou a questão da democracia no horizonte. Não sabemos ainda o que vai acontecer nesses lugares. Só sabemos que tanto Bush como Bin Laden estão perdendo.”
A vida de repórter me deu a chance de ver muita coisa de perto. Tristes e tensas, como enterro dos sem terra mortos em Eldorados dos Carajás ou a ação dos Tupac Amaru ao seqüestrar um monte de embaixadores ao mesmo tempo, no Peru; a queda de avião da TAM em 1996 e o enterro do Papa João Paulo II; a revolta violenta dos trabalhadores moçambicanos em Maputo, em 2010, ou encontrar uma sobrevivente do genocídio de Ruanda em frente a uma igreja que virou memorial, bem no meio do país.
Também vi fatos alegres e emocionantes, como a final da Copa de 98, a abertura da Copa de 2002 ou a final dos 100 metros rasos na Olimpíada da Grécia. E também instantes históricos, como a eleição (interminável) e posse de Bush nos EUA e a posse de Lula, a poucos metros dele, no Congresso Nacional; a visita de Lula a Obama na Casa Branca (o operário nordestino e o negro pela primeira vez no Salão Oval), e até a cerimônia com as virgens e o rei da Suazilândia.
Integrante da realeza de sua região, foi estudar e montou o primeiro escritório de advocacia comandado por negros na África do Sul (ele e Oliver Tambo – que hoje é o nome do aeroporto de Joanesburgo).
Africanista de princípio, foi moldando seu pensamento durante a luta contra a discriminação e o apartheid. No começo, defendia que os negros retomassem o país e expulsassem os brancos. Com o tempo, viu que isso o igualava com os racistas, e mudou de posição.
Passou 27 anos preso por lutar para simplesmente poder ser ele mesmo. Recusou a liberdade quando ela foi oferecida sob condições. Só saiu realmente livre, para pensar e agir. Eleito presidente, poderia massacrar quem o massacrou – mas não. Até contra a vontade de muitos de seus apoiadores, mostrou que o país ( e o mundo) é de todos.
Li sua autobiografia. Agora, estou lendo sua biografia escrita por um jornalista. Ele não é santo – cometeu erros, mudou de opinião, reviu o que havia dito, feito e escrito. Mas… mas.
A ONU consagra o 18 de julho a Nelson Mandela. Longa vida a quem deu a maior parte dela a uma causa. Que viva Nelson Mandela.
O texto abaixo foi publicado nesta época, um ano atrás.
Deu discussão. Por isso – rá! – republico.
Reli e não me arrependo… Talvez tenha deixado entender que a Espanha era uma porcaria. Não era. É um bom time – mas nada revolucionário ou maravilhoso. O mesmo para Holanda, num grau um pouco abaixo, até.
Mereceu? Sim, diante do quadro. Se os grandes jogassem como grandes, tudo seria como sempre foi.
“Pela primeira vez desde sempre, Holanda ou Espanha será o campeão. A Europa vai ganhar uma Copa fora do continente. A seleção-sede não passou da primeira fase. E – pra mim o mais inusitado – a final da Copa do Mundo não vai ter Brasil, Itália, Argentina ou Alemanha.
Li coleguinhas dizendo que é “novidade”, “momento histórico”, e tal. Perdão, caros. Para mim não é “novidade”. É um absurdo.
“Então só os grandes podem ter vez, é?” Não. Qualquer um pode ter a sua vez. Os grandes é que não podem deixar a sua vaga escapar.
Brasil, Argentina, Itália e Alemanha moldaram o jogo de futebol como conhecemos. Sem eles, o futebol não seria o mesmo. Não teria ginga, criatividade ou graça. Não teria garra, emoção e categoria. Não teria líbero, e meio campo pegador. Não teria a mesma organização tática, força e disciplina.
Se todos eles fracassam, fracassa o jogo que aprendemos a admirar. Mudança radical, que não vi ser para melhor.
Só admito todos eles fora em caso extremo extremíssimo. Se a Holanda de 74 ocupasse o lugar. Ou a Espanha cheia de craques dos anos 50, que tinha até Di Stefano e Puskas.
Mas a Holanda de 2010 não é a Holanda de 74. E a Espanha de 2010 é a Espanha de sempre.
Fatos, que nem todos querem ver: os ditos craques claramente chegaram mortos, quebrados ou desinteressados no torneio. Não jogaram nada. Nas oitavas de final, erros crassos dos árbitros, contra México e Inglaterra, definiram classificados. Não houve uma única e escassa tentativa – sequer esboço – de inovação tática de ninguém.
Houve jogos emocionantes – claro. Mas emoção motivada pela ruindade, pelo erro. Casos da desclassificação de Gana e do Paraguai. Perder pênaltis no último minuto da prorrogação e dois no mesmo minuto, em fase decisiva de Copa, é imperdoável. Mas deixou os jogos bem mais emocionantes mesmo.
A Copa lembrou, de certa maneira, o Brasileirão do ano passado. Vários times tiveram chance e todas as condições de ganhar o campeonato, mas deixaram escapar. Ganhou o Flamengo porque, por acaso, estava em primeiro quando acabaram as rodadas. Estava claro que, se houvesse mais jogo, poderia dar outro time.
Como ninguém quis ganhar, Holanda e Espanha disputam o título no domingo. Finalmente, um desses contumazes fracassados em Copas do Mundo será o vencedor. O fortuíto campeão de uma Copa cheia de “novidades”.
O prêmio ganho pelo jornalismo da TV Miramar virou reportagem no Hoje em Dia, da TV Record do Brasil, que também é exibido aqui em Moçambique pela própria Miramar, e em mais de outros 100 países, via Record Internacional.
O nosso, muito nosso, Celso Zucatelli foi – como sempre – gentilíssimo com a TV Miramar, com a Selma, comigo e, claro, com o telespectador moçambicano.
Celso, Edu, Jeane e Cris são tão conhecidos aqui quanto no Brasil. E, também como no Brasil, lideram a audiência em Moçambique, durante as tardes, quando o Hoje em Dia está no ar.
A reportagem de Selma Marivate sobre os rastafaris em Moçambique recebeu o prêmio CNN Africa Multichoice na categoria “notícias gerais em português”.
No ano passado, o repórter Sérgio Sitóe já havia sido selecionado para a final. Neste ano, o trabalho da Selma foi reconhecido pelo juri final.
Reconhecimento ao talento e esforço dela, do Departamento de Informação da TV Miramar (que, não por acaso, é ela que dirige), e também ao jornalismo moçambicano – e, em especial, o de televisão.
Em quatro meses aqui, tenho aprendido muito. É uma troca rica e interessante. Estou permanentemente revendo meus conceitos, tendo que pensar antes de sugerir ou fazer coisas que, no Brasil, eu tomava por certas sempre. Enfrento dificuldades aqui que me ajudam a criar saídas, pensar em alternativas. Cansa, mas é muito bom.
Ao mesmo tempo, acho que consigo ajudar à turma de cá a descobrir coisas novas, tentar novos caminhos, pensar de um outro jeito, entender como funciona a nossa máquina de fazer televisão. Aqui vê-se muito TV do Brasil, mas fala-se pouco sobre ela.
Sempre digo a eles que a minha idéia não é ensinar nada a ninguém. Mas sim mostrar uma experiência. Nada é para ser copiado, mas para ser conhecido, e só adaptado se fizer sentido.
Afinal, como o prêmio comprova, a moçada sabe o que faz.
A peça premiada tem uma hora – é um episódio do programa Contacto Directo, de reportagens especiais.