Dia da Criança Africana

Repito aqui o post que publiquei há exatamente um ano, no local onde ocorreu o massacre que deu origem à celebração de hoje, no bairro do Soweto, Joanesburgo, África do Sul.

Além da linda foto de Marcelo Casal, nele há o link para a reportagem que fiz para a TV Brasil, em meio à Copa do Mundo.

Aqui em Moçambique, é dia de dupla homenagem. Às crianças e aos velhos combatentes. Pois foi também num 16 de junho que se deu o episódio que motivou o início da luta de libertação do país (na prática foi em 25 de Setembro, o “dia do primeiro tiro”).

Há 51 anos, ocorreu o Massacre da Mueda, quando as forças coloniais responderam a bala a um dos primeiros movimentos pró-independência de Moçambique.

Levou 15 anos para chegar à libertação. Muita gente morreu no período. Tanto aqui, na luta armada, quanto em Portugal – primeiro, o ditador Antonio de Oliveira Salazar; e, em 1974, a ditadura que ele instalou.

Minha homenagem a quem luta pela sua causa. Entre eles, Ahmed Kathada, que aparece na reportagem aí. Acabo de ler a biografia de Nelson Mandela e “Kathy” – como Mandela refere-se a ele – é personagem de muito destaque. No livro, e na luta.

Esta quarta-feira foi o Dia da Juventude. Ela saiu às ruas de Soweto para lembrar que liberdade se conquista. E o quanto custa essa conquista.

O garoto da foto ficou nos rodeando durante a visita ao memorial de Hector Pieterson. Ele tem 11 anos, a mesma idade que tinha Pieterson quando morreu baleado pela polícia no protesto que deu origem ao feriado. Ele lia os nomes dos meninos que morreram na época, nos conflitos que seguiram ao ataque de Soweto. Eles estão marcados nessas pedras, espalhadas pelo chão.

Reparou nos olhos dele?

Fotos do Marcelo Casal, da Agência Brasil. A galeria completa está aqui.

A visita também rendeu reportagem no Repórter Brasil, que conta mais detalhes sobre a data, o significado dela e traz uma entrevista com um ícone sul-africano, Ahmed Kathrada, um dos ativistas condenado à prisão perpétua junto com Mandela, em 1964. Veja aqui.

Energia, Luz, África

Mais sobre o assunto, agora publicado pela Agência Brasil.
A foto é da Agência também, feita por Marcello Casal, na África do Sul. Aliás, lembra das belas imagens da Copa do Mundo? Veja de novo clicando aqui.

06/11/2010
Países africanos se unem para enfrentar desafio de ampliar oferta de energia elétrica

Eduardo Castro
Correspondente da EBC para a África

Maputo (Moçambique) – Pela primeira vez, ministros de Estado, especialistas e investidores de toda África reuniram-se para discutir alternativas de geração e distribuição energia no continente. Foram cinco dias de encontros, palestras e reuniões em três eventos simultâneos: o All Africa Energy Week, o Fórum Africano de Investimento em Energia e o Encontro de Ministros de Energia da União Africana.

Na pauta dos ministros, políticas continentais como a operacionalização de um Fundo de Petróleo, além de discussões em torno de estudos referentes à produção de energia alternativa (especialmente a solar), entre outras iniciativas.

O participantes preparam a criação um mecanismo único de monitoramento e comunicação entre os países. Empresas tiveram espaço para fechar negócios e divulgar de experiências e estratégias para aumentar o acesso à luz elétrica em um ambiente de mudanças climáticas. Além do governo moçambicano, o evento teve o apoio do Banco Africano de Desenvolvimento, da Comissão Econômica Africana das Nações Unidas e da União Africana.

“Vamos chegar aos nossos objetivos de levar energia a muito mais gente na África”, afirmou o ministro de Energia de Moçambique, Salvador Namburete. “Ainda pode demorar, porque os recursos são escassos. Mas o comprometimento político dos governos, a clareza dos objetivos e a priorização de projeto melhor estruturados vão permitir a integração dos sistemas, que os países trabalhem em conjunto.”

Pelos levantamentos do fórum, o maior desafio para a infraestrutura da África é, de longe, a geração de energia. Apesar da abundância de potencial hídrico, vento, sol e recursos minerais, como petróleo e carvão, 30 dos 52 países do continente sofrem cortes regulares no fornecimento de luz elétrica. Atualmente, os 48 integrantes da África Subsaariana geram, juntos, menos eletricidade que a Espanha.

Atualmente, a Nigéria, maior produtor africano de petróleo, gasta U$ 13 bilhões só com aquisição de óleo diesel para gerar energia. U$ 10 bilhões R$ seriam suficientes para suprir a demanda do país. É que um terço dos equipamentos de geração e transmissão na Nigéria está inoperante por falta de manutenção adequada.

Muitos investimentos esperados pelo setor estão parados à espera de uma revisão das leis que regulam o setor energético. De acordo com o governo nigeriano, a Lei da Indústria do Petróleo deve ser votada até o fim do ano. As novas regras devem modificar a cobrança de impostos sobre empresas estrangeiras que exploram petróleo no país.

Estudos internacionais mostram que o potencial hídrico da República Democrática do Congo, se aproveitado integralmente, seria capaz de gerar o triplo da energia que o continente consome atualmente.

O impacto econômico da falta de fornecimento regular de energia também é grande. A estimativa do fórum é que, pelos menos, 5% das vendas das empresas do continente sejam perdidos pelo fornecimento irregular de luz elétrica. Somado ao imenso setor informal africano, o prejuízo sobe para 20%. Segundo o Banco Mundial, o impacto típico na economia como um todo de um país varia entre 1% e 4% do Produto Interno Bruto (PIB) anual.

Eletrificar toda a África custa muito. A construção de infraestrutura no continente é, em geral, duas vezes mais cara do que nos restante do mundo, por causa da pouca concorrência e por questões de escala. Técnicos do Banco Africano de Desenvolvimento estimam os países africanos precisariam investir cerca de que U$ 93 bilhões por ano no setor de energia, sendo um terço desse valor só para manutenção da infraestrutura existente. E a estimativa é que o déficit nas contas governamentais do setor seja de, pelo menos, U$ 31 bilhões por ano.

“Com recursos financeiros suficientes, poderíamos programar os investimentos corretamente”, explicou o ministro moçambicano Salvador Namburete. “Mas programas de expansão, com o da eletrificação rural, por exemplo, devem ser acompanhados da devida formação dos técnicos provedores do serviço. Tanto para garantir a qualidade da energia quanto para informar as comunidades sobre como fazer o uso racional e eficiente dela.”

No mundo todo, quase 1,5 bilhão de pessoas não têm acesso à energia elétrica, percentual que corresponde a cerca de 20% da população. Em 20 anos, toda a América Latina estará eletrificada. Em menos tempo, já em 2015, a falta de luz elétrica não deve mais ser problema na China. Mas na África, em parte da Ásia, em especial na Índia, 1,2 bilhão de pessoas continuarão dependendo do carvão, de velas e de geradores a diesel para se aquecer, preparar a comida ou fazer uma máquina funcionar.

Os dados são da Agência Internacional de Energia (AIE), divulgados durante as reuniões das Nações Unidas sobre o cumprimento das Metas do Milênio, em setembro passado. “O impossível acesso a serviços modernos de fornecimento de energia cria sérios obstáculos para o progresso econômico e social. A questão deve ser superada se quisermos avançar nas Metas do Milênio”, alertou a AIE.

06/11/2010
Investimentos em energia na África não garantem fornecimento estável e de qualidade

Eduardo Castro
Correspondente da EBC para a África

Maputo (Moçambique) – Falando na abertura do All Africa Energy Week, o primeiro-ministro de Moçambique, Aires Ali, afirmou que o fluxo de investimentos no setor não tem acompanhado o crescimento das necessidades de consumo da população e das empresas africanas nos últimos 25 anos. De acordo com Ali, a saída é investir na diversificação da matriz energética e no uso de tecnologias de baixo custo. A maior parte do fornecimento do país ainda vem da queima da madeira e do carvão. Na média, as empresas sofrem 17 cortes no fornecimento de luz todos os meses.

Segundo o Ministério da Energia, Moçambique necessita de quase U$ 1 bilhão por ano para investir no setor, dinheiro que não está disponível no momento. Entre 2005 e 2009 foi gasto só metade disso, cerca de U$ 500 milhões de dólares, na construção de novas linhas de transmissão e na montagem de infraestrutura de geração e distribuição.

Dois projetos de geração de grande escala, a Usina Hidrelétrica de Mphanda Nkuwa e as termelétricas a carvão de Benga e Moatize, e um de recuperação das centrais de Chicamba, Mavuzi e Corrumana, estão sendo executados conforme o previsto, apesar de alguns problemas na obtenção de crédito.

“Mesmo tendo sol, vento, rios, ainda não temos ainda fundos necessários para ter a África completamente eletrificada”, lamentou Miquelina Menezes, presidenta do Conselho de Administração do Fundo de Energia de Moçambique (Funae). “Há zonas onde a energia não vai chegar tão brevemente e os moradores não podem simplesmente esperar por ela”.

O Funae apoia financeiramente projetos de produção, distribuição e conservação de energias renováveis e na zona rural. “Estamos no começo, mas já temos muitos projetos e a certeza de que as energias renováveis tem um impacto muito grande”, afirmou. “A chegada da luz muda completamente a forma de viver dessas pessoas, principalmente nas vilas mais afastadas.”

Em Moçambique, somente 14% da população têm acesso à rede principal de distribuição. Cerca de 1,8 milhão de pessoas (pouco menos de 10% da população do país) beneficiam-se de energias renováveis, graças a iniciativas que usam energia solar, pequenas centrais hidrelétricas ou pequenos projetos de geração eólica voltados à irrigação. “Muitos ainda não têm luz em casa, mas já se beneficiam da chegada dela nos núcleos urbanos, nos centros de saúde, nas escolas e na iluminação pública”, explicou Menezes.

Outros projetos já começam a produzir luz a partir de sementes ou plantas. “Sou apologista do biodiesel”, afirmo ela, que não vê problema em usar terras agricultáveis para produzir energia, mesmo em uma região onde a fome ainda é um flagelo. “Aqui há uma regulamentação de quais os produtos que podem ser usados na produção de biocombustíveis. E há espaço suficiente”, assegurou. “Queremos usar o biodiesel para os geradores nos distritos, para justamente baratear o preço da energia usada na agricultura. Também poderemos ter a mistura do biodiesel com os combustíveis fósseis para minimizar os custos de importação e usar nas grandes frotas”, explicou a presidenta da Funae.

A dificuldade de levar luz para todos não está apenas apenas na geração e no transporte. Muitas famílias simplesmente não têm renda suficiente para pagar a ligação da residência com a rede principal e, muito menos, para manter a conta de luz em dia. É o caso de Arnaldo Mabilane, que vive com a mulher Gina e duas filhas gêmeas de 3 anos de idade no bairro de Mahotas, na periferia da capital moçambicana, Maputo.

Os vizinhos da família Mabilane já têm luz em casa, porque a rede principal chegou ao bairro. “Mas eu ainda não reúno condições para arranjar interruptor, eletricista… e pagar a conta”, lamentou ele, que trabalhava como segurança, mas está desempregado há três meses. Na casa de um único cômodo, divido por uma cortina em quarto e sala, a família tem como diversão um rádio, ligado a uma bateria de carro. O fogareiro é a lenha e a lamparina, a querosene. O óleo, inclusive, é vendido por Arnaldo na vizinhança, uma forma que ele arranjou para sustentar a família desde que perdeu o emprego. No teto, um lustre pende à espera dos fios que um dia, diz Arnaldo, virão. “Hoje está aí para embelezar apenas. Ligar é o próximo passo”.

Edição: Vinicius Doria

Oh! Mas que surpresa…

Reportagem do Vinicius, na Agência Brasil, sobre o destino dos estádios depois da Copa. Não é por falta de exemplo, nem de aviso. Para este país aqui, e para o próximo também.

Aqui a galeria completa das fotos do Marcello Casal.

07/07/2010
Manutenção de estádios sul-africanos depois da Copa do Mundo preocupa especialistas

Vinicius Konchinski
Enviado especial

Joanesburgo – A reforma e a construção dos dez estádios da Copa do Mundo custaram cerca 16,5 bilhões de rands (R$ 3,8 bilhões) ao governo da África do Sul. Obras modernas e belíssimas foram realizadas no país para abrigar os 64 jogos do torneio. Entretanto, a utilização e a manutenção desses locais após o Mundial já preocupam especialistas antes mesmo da partida final.

Para empresários do futebol ouvidos pela Agência Brasil, os estádios sul-africanos tiveram um custo muito alto e foram projetados com capacidade maior que a necessária. Serão, por isso, em sua opinião, insustentáveis financeiramente depois da Copa.

O diretor da companhia sul-africana Stadium Management, Barry Pollen, afirma que cinco dos seis novos estádios da África do Sul ficam em cidades onde não há um time de futebol nem de rugby – esporte popular no país – interessados ou capazes de mantê-los. Essas arenas estão localizadas na Cidade do Cabo, em Durban, Nelspruit, Port Elizabeth e Polokwane.

“Na Cidade do Cabo e em Durban, há times de rugby tradicionais, mas eles já têm seu próprio estádio e não pretendem sair dele”, disse Pollen. “Já nas outras cidades, não há nada. A construção de estádios com capacidade para 40 mil pessoas foi um desperdício de dinheiro público.”

De acordo com Pollen, estádios, em geral, já são obras que dificilmente dão lucros aos seus investidores. Na África do Sul, entretanto, a falta de um plano de negócios para essas arenas tornou os projetos ainda mais impossíveis de se autofinanciar após a Copa.

“Os estádios deveriam ter espaços para convenção, estrutura para shows, centros de exposição ou até um hotel”, afirmou. “Isso traria mais receita para quem o mantém. Faria com que a estrutura fosse melhor aproveitada.”

O presidente da Liga Sul-Africana de Futebol, Kjetil Siem, confirma que os clubes do país ainda não têm condições de assumir o custo anual aproximado de 10 milhões de rands (R$ 2,3 milhões) para a manutenção de um dos menores estádios construídos para o Mundial. Ele acredita que, pelo menos durante os próximos anos, o governo sul-africano vai arcar com essas despesas.

Para ele, a utilização dos estádios da Copa também é um desafio para a liga de futebol do país. Atualmente, os jogos do campeonato sul-africano têm uma média de 11 mil espectadores. Para que os novos estádios ficassem lotados, essa média precisaria quadruplicar.

Siem espera, porém, que os estádios da Copa sejam mais um atrativo para os torcedores da África do Sul. “Com estádios mais seguros, confortáveis, mais sul-africanos podem tornar-se frequentadores dos jogos”, avaliou. “Isso faria esses estádios mais úteis”.

Torceu pra Holanda? Ou pro Uruguai?

No geral, pelo que deu pra perceber, o sul-africano torceu para a Holanda. Achei que eles fariam uma associação dos holandeses com os afrikaners, mas não vi isso na rua não.

Prevaleceu a raiva mais recente: o Uruguai ganhou da África do Sul e tirou Gana da Copa. Virou alvo a ser batido.

Veja como ficou a reportagem, exibida no Repórter Brasil, clicando aqui.

E a galeria completa de fotos da Agência Brasil está aqui
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Soccer City

Já tive a chance de conhecer muitos estádios bonitos. Soccer City é um dos top. Pra mim, o mais lindo e impressionante é o Ninho do Pássaro, de Pequim, que conheci numa visita à China logo depois da Olimpíada. O Stade de France, em Paris, também é deslumbrante.

Os da Coréia não eram tão espetaculares, mas também eram lindos. O de Suwon era um cisne perfeito. O de Incheon parecia uma tenda, e das cabines dele se via o mar.

Mas esse daqui de Joanesburgo é, ó, coisa linda de noite e de dia.

Fotos do Marcello Casal. Hoje ele também publicou na Agência Brasil uma galeria sobre eletricidade, que vale das uma olhada com calma. Tá aqui, ó.

Bom. Mas para poucos.

Ao longo de toda Copa temos mostrado os contrastes de Joanesburgo e da África do Sul como um todo. Lembra o Brasil: em desenvolvimento, mas algo que não chega para todos.

A diferença – entendo eu – é que os sul-africanos começaram a implementar medidas para fechar esse buraco entre quem pode tudo e quem só pode sonhar antes de nós. Meritocracia sim; mas desde que todo mundo tenha a oportunidade de começar a disputa no mesmo ponto. Tanto aqui na África quanto no Brasil é preciso fazer algo pra colocar todo mundo alinhado para a partida. E aqui fazem há mais tempo.

Só assim é possível dizer que a competição é justa e ganha só quem tem mais mérito.

Costumo dizer que sou o privilégio em forma de gente: homem, branco, paulista, paulistano, estudei só em escola particular, sempre tive plano de saúde, fiz esporte no clube privado, minha família é estruturada. Graças a tudo isso, pude fazer intercâmbio adolescente e aprender duas línguas estrangeiras; entrei em duas faculdades privadas, escolhi minha profissão. Mais adiante sempre pude contar com minha família em qualquer aspecto: conselhos, experiência, recursos.

Se eu não chegasse onde quisesse, seria por vagabundagem ou muita incompetência. Acho que cheguei onde pretendia, e logo. Mas, sinceramente, meu único mérito foi cumprir minha obrigação.

Quantos outros – mais talentosos, inteligentes ou esforçados do que eu – infelizmente não conseguiram alcançar seus sonhos porque largaram quilômetros atrás de mim? Mérito meu? Culpa deles? Certamente não.

Vinícius escreveu uma reportagem para a Agência Brasil que mostra como esse contraste afeta a percepção da importância da Copa estar sendo aqui. Leia e veja as fotos, do Marcello Casal.

04/07/2010
Desigualdade reflete envolvimento de sul-africanos com Copa do Mundo

Vinicius Konchinski

Enviado Especial

Joanesburgo (África do Sul) – Joanesburgo é uma das três cidades mais desiguais do mundo, segundo o Programa das Nações Unidas para Assentamentos Humanos (UN-Habitat). As diferenças entre as condições socioeconômicas de sua população são evidentes. Influenciam até na forma com que as pessoas que vivem ali enxergam e se envolvem com a Copa do Mundo sediada pela África do Sul.

Apesar de a alegria motivada pela recepção do torneio ser quase unânime entre os sul-africanos, dependendo da área de Joanesburgo e da situação em que vivem os seus habitantes, percebe-se uma aprovação maior ou menor do Mundial. Enquanto moradores de áreas mais nobres vibram com a realização da primeira Copa em um país do Continente Africano, quem vive em locais mais pobres duvida dos seus benefícios.

Essa diferença é percebida até mesmo dentro de determinados bairros da cidade. Em Soweto, por exemplo, negros que conseguiram emergir economicamente após o fim do apartheid vêem a Copa como uma conquista sul-africana. Já os que sofrem com o desemprego e falta de infraestrutura básica dizem que o torneio não representa nada para eles.

“Eu pensava que a Copa traria alguma coisa boa. Mas até agora, nada”, diz Nelly Ntubi, moradora de uma das favelas de Soweto, a Holomisa Camp. Ela mora com outras dez pessoas, quatro delas crianças, em uma casa construída por seu próprio marido usando lâminas de metal. De todos os membros de sua família que dividem a mesma moradia, só ele tem emprego. Nenhum, contudo, tem acesso à água tratada, esgoto ou eletricidade. “Não tenho nem como assistir aos jogos”, afirma ela. “Para mim, a Copa não significa nada.”

A alguns metros da casa de Nelly, porém, outra moradora de Soweto tem uma visão bem mais otimista sobre o Mundial. Beauty Shezi é recém-aposentada e proprietária de uma casa confortável perto de uma das entradas do bairro, num local chamado Diepkloof Extension. Ela afirma não ser fã de futebol, mas acompanha o torneio, principalmente o desempenho das seleções africanas. Para Beauty , a Copa é a chance da África do Sul mostrar ao mundo que as histórias de segregação racial e a violência ficaram para trás. “Todo mundo que vier para cá vai saber que o apartheid é passado. Há um preconceito contra o país. A Copa vai ajudar a acabar com ele.”

Sobre as desigualdades na África do Sul, Beauty acha que isso ainda é um problema a ser solucionado. Para ela, a falta de trabalho e educação acabam empurrando seus compatriotas para a pobreza. Ela espera, entretanto, que o Mundial ajude a resolver isso. “A Copa está gerando empregos e pode dar alguma ajuda a essas pessoas.”

Estamos fora. Nós Brasil. Nós África.

Assisti ao Brasil e Holanda na Casa Brasil, com telão ligado na Globo. Finalmente um jogo com gritaria de narrador! Se bem que a voz do nosso estrelo-maior na esgoelação esportiva foi igual à seleção brasileira: ficou pelo caminho.

Faz diferença. Futebol tem que ter grito, emoção. Não dá pra narrar gol com o mesmo entusiasmo de um arremesso lateral, como fazem aqui.

Foi duro aguentar uma ou outra demonstração de sapiência ou de pitonismo. Sem contar o discursinho no fim. Mas Casão, Júnior e Falcão garantem o equilíbrio.

Quanto terminou o jogo, foi aquele velório. Aliás, quando nós vamos viver a derrota no futebol com mais naturalidade? 31 perdem na copa. Ganha só um.

Pelo menos a tristeza rende belas fotos…

Depois fui ver Gana e Uruguai num bairro de imigrantes aqui em Joanesburgo, que parecia uma cidade de Gana.

Deu uma pena!

Com Gana vencendo por um a zero, eles comemoraram no intervalo com se o jogo tivesse acabado! E no final, morreram de raiva. Ficaram decepcionados. Ficaram tristes na hora. Mas, pelo menos ali, a sexta-feira à noite prosseguiu com cara de sexta-feira à noite.

Aqui, mais fotos do Marcello Casal no jogo do Brasil. E aqui as imagens do Ulov Flamínio no jogo de Gana.

África do Sul e AIDS

Fomos a uma cidade no interior, perto de Pretória, pra fazer uma reportagem sobre AIDS, acompanhando um ônibus montado pelo Ministério da Saúde do Brasil e duas ONGs que atuam aqui na África do Sul.

O local escolhido para o primeiro workshop de troca de informações com os jovens sobre prevenção foi uma escola. Como a garotada está de férias, os portões ficam abertos para crianças de todas as idades, como se fosse uma grande creche.

Ver aquela molecada ali, sabendo de onde elas vêm e qual o futuro provável que elas terão enrosca a garganta de qualquer um.

As fotos do Marcello Casal e as imagens do Ulov Flamínio acentuam isso à enésima potência.

Que essa meninada engane o futuro provável. Dê um drible nele.

Aqui, a galeria completa de fotos.

E aqui a reportagem que foi ao ar na TV Brasil, no Repórter Brasil.

A alva torcida verde amarela

Suponha que você nunca tenha estado em um estádio ou visto uma imagem sequer de torcedores em estádios brasileiros de futebol. E, por um milagre, surja no meio da torcida brasileira em um jogo aqui na Copa do Mundo da África do Sul.

Como você descreveria o brasileiro que vai aos jogos de futebol?

Fácil: bilíngue, pele clara, metade homem, metade mulher, muito enfeitados, perfumados, bem vestidos. Na foto acima, de Marcello Casal, temos um exemplo típico de um brasileiro frequentador de estádios.

Igualzinho ao que acontece no Maracanã, né?