Miranda, Jesus e a Fogueteira

braxChi

Publicado sexta, 09 de outubro (05:59)

(Nota: estou republicando aqui no meu blog ElefanteNews minhas primeira colunas no Fato On Line. Cheque a data antes de discutir velhas novidades…)

Escrevo antes de começar Chile e Brasil, primeiro jogo das Eliminatórias da Copa de 2018. Almocei há pouco num simpático quilo aqui no Flamengo. A TV estava ligada e apareceu Miranda (que, talvez, você não associe o nome à pessoa, é…), o capitão da seleção brasileira. Ele diz, de bracinhos cruzados em frente ao microfone fininho: “Se empatarmos, já vai ser um bom resultado”. Do meu lado, um senhor de camisa branca meneia a cabeça e vira o rosto na minha direção, sem dizer nada. Só me olha com aquela cara de “a que ponto chegamos”.

De fato. Lembro do tempo (e não estou falando de quando Dondom jogava no Andaraí, de meia na cabeça, chutando bola de capotão) em que ganhar do Chile era mais que premissa, era uma obviedade. Até acontecia de perder ou empatar, mas, “quando acontecia, era um acontecimento”.

Rosinery Mello morreu aos 45 anos, vítima de aneurisma Ronald Theobald/Estadão Conteúdo

Em 1989, foi mais que um acontecimento – foi uma série deles, e , mesmo assim, o Chile não ganhou. Eles tinham um técnico falastrão, chamado Orlando Aravena, que convenceu o país de que, daquela vez, dava pra não apenas se classificar, mas sim ganhar a Copa do Mundo. No mesmo grupo, estavam Brasil e Venezuela; na Venezuela, coitada, todo mundo batia. Restava tirar o Brasil em dois jogos, um lá, outro cá.

O primeiro foi lá, no mesmo Estádio Nacional da final de 1962 e do jogo de agora, 2015. Já antes de o jogo começar, Aravena falou qualquer coisa no ouvido do Romário, que revidou com empurrões. Contagiado pelo clima – ou por alguma outra coisa contagiante –, o preclaro Jesus Dias Palácios, árbitro colombiano (até bom), deu amarelo pra ele antes de a bola rolar. Com dois minutos de jogo, Ormeño, um dos que Romário havia empurrado, deu uma voadora em Branco. Romário foi tirar satisfações. O juiz tirou o vermelho do bolso. Me lembro bem de ter feito uma cara parecida com a que o senhor fez hoje pra mim, no restaurante. Jesus não estava nada brasileiro naquele dia. Muito pelo contrário.

Ainda no primeiro tempo, ele marcou um sobrepasso de Taffarel. Acho que foi a última vez que vi juiz marcar sobrepasso. Um chileno pegou a bola das mãos do goleiro e tocou rapidinho, dentro da pequena área. Tudo errado, porque a infração (mesmo que inventada, como foi) deveria ter sido batida na linha da pequena área. Gol do Chile. Parêntesis: graças a esse lance é que você aguenta Arnaldo César Coelho comentando arbitragem até hoje. No dia seguinte ao jogo, o então diretor da Globo, Armando Nogueira, ligou pra ele, perguntando do lance. Satisfeito com a explicação, convidou Arnaldo pra almoçar e o chamou pra trabalhar na Globo. Dias depois, Arnaldo anunciou que estava parando de apitar pra ser comentarista. Fecha parêntesis. O Brasil ainda conseguiu empatar a partida.

Rojas e Rosi

A partida de volta foi no Maracanã, no famoso “jogo da fogueteira”. Os mais novos não lembram, mas houve tempo em que se podia levar rojão pra dentro do estádio. Uma moça, chamada Rose, uma das 141 mil pessoas presentes naquele dia, acendeu um sinalizador marítimo, que caiu perto do goleiro Rojas (o mesmo que jogou no São Paulo). O Brasil ganhava por 1 a 0, gol de Careca, e o resultado tirava o Chile da disputa.

Rojas diria depois que o clima feito no Chile em torno da possível classificação ficou tão fora de controle que ele não teria coragem de voltar sem a vaga. Desesperado, enfiou uma lâmina na luva, esperando uma chance de simular uma contusão. Ao ver o foguete no gramado, caiu, tirou a lâmina discretamente e fez um corte na testa, como se tivesse sido atingido. O jogo parou, estabeleceu-se uma confusão, e o Chile saiu de campo carregando seu mártir. O jogo foi encerrado pelo argentino Juan Carlos Lousteau. O Chile saiu do estádio se dizendo classificado. Os brasileiros estava atônitos. E ninguém sabia o que iria acontecer.

Hoje em dia, fatalmente, algumas das trocentas câmeras em campo, ou mesmo um celular de torcedor, teriam mostrado o que ocorreu rapidamente. Mas os tempos – como disse lá em cima – eram outros. No dia seguinte, uma sequência de fotos do jornal O Globo deixava claro que o sinalizador havia caído a alguns metros de Rojas, sem feri-lo. O Brasil foi confirmado como vencedor. A seleção chilena, suspensa por quatro anos; Astengo, zagueiro, também. Rojas foi banido do futebol (anistiado anos depois, quando voltou a trabalhar no São Paulo como auxiliar), junto com o técnico Avarena, um médico da delegação e um dirigente chileno. A fogueteira, localizada, virou capa de Playboy, mas sumiu em seguida. Ela morreu em 2011, vítima de um aneurisma.

Nem com Jesus do lado deles e sinalizador chovendo em campo, o Chile nos punha medo. Hoje, como diz Miranda, se empatar, vai ser bom. Ponto. Parágrafo.

Dunga faz história

Agora escrevo depois da estreia do Brasil nas Eliminatórias. Depois da primeira vez em que o Brasil perdeu numa estreia de eliminatórias de Copa: 2 a 0 para o Chile. Tá: é o melhor Chile da história. Mas nós ajudamos.

O time de Dunga, aliás, parece que não saiu do Chile desde a Copa América. A mesma coisa modorrenta, sem criatividade, sem brilho. Transpirando no limite do necessário. É muito jogador mais ou menos numa seleção brasileira – todos vindos da Europa ou do time que levou de sete da Alemanha. Não entendo tanta insistência com essa turma. Também não entendo quem diz que são “bons jogadores”. Não são. São medianos.

Houve tempo em que mediano não cabia na seleção. Mais recentemente, o mediano tinha que se matar, suar sangue. Mas os tempos são outros. Na segunda etapa, entram dois do Santos – Ricardo Oliveira e Lucas Lima – e o time melhora. Pouco, mas sobe de produção. Não o suficiente. Nada garante que, se Neymar tivesse jogado, a coisa teria sido diferente.

A conversa agora é dizer que “o time comportou-se bem, mas está tudo muito equalizado”, uma versão mais moderna da velha frase, dita há uns 30 anos, que “não tem mais bobo no futebol”. Papo. Se eles melhoraram, os melhores deveriam ter melhorado também. Não, ficamos pra trás.

Que Miranda e seus colegas façam alguma coisa diferente já, agora, terça-feira (13), contra a Venezuela. Mas não tentem trazer Jesus pro nosso lado, nem comprar sinalizadores para espalhar na torcida. Muito menos simular contusão pra sair de campo coberto de glórias. Não funciona. Os tempos, definitivamente, são outros. A que ponto chegamos.

http://fatoonline.com.br/conteudo/10366/miranda-jesus-e-a-fogueteira?or=h-opi-colu&p=l&i=2&v=0

É esquema? Não acho. Mas não é mimimi. Tá demais.

Uns dias atrás, escrevi sobre os erros – frequentes e decisivos – dos senhores árbitros no atual campeonato brasileiro, na minha coluna semanal no Fato On Line.
Segue atualíssima. Ó:

“No fim de semana passado, os árbitros protestaram antes do início das partidas do Campeonato Brasileiro. Usaram tarja preta no braço, fizeram um minuto de silêncio e até levantaram aquelas placas eletrônicas que informam as substituições com mensagens que só eles entendiam: “05” (indicando o meio por cento que reivindicam do total arrecadado com direito de arena e que foi vetado na transformação da Medida Provisória do Futebol em lei), ou “671” (o número da tal MP). O veto teve motivos técnicos, segundo o Palácio do Planalto.

Juiz é parte marginal do espetáculo (tanto quanto treinadores, dirigentes e jornalistas, por exemplo). Como ninguém vai ao campo ver juiz, acho que não fazem jus ao pixulé (nâo confundir com pixuleco). Devem receber prebenda compensadora, diria o douto – de preferência, mensal e pré-definida, independentemente de bons ou maus resultados nos jogos, deles próprios ou dos contenedores de fato. Porém, os senhores e senhoras árbitros andam errando tanto, influindo tanto nos resultados – e aparecendo tanto – que, a continuar assim, em breve vão merecer percentual na renda, camarim com estrela e nome na porta, citação na propaganda e toalhas brancas no vestiário”.

Leia o resto do treco clicando aqui, por favor…

http://www.fatoonline.com.br/conteudo/7732/na-duvida-apito-e-para-os-fortes?or=he-espo&p=od&i=2&v=0

O Importante – sempre tão importante

microfone de rádio” – E aí, Fulano: vitória importante…
– Sem dúvida. Foram três pontos importantes, com um gol no momento importante, com a participação importante de todo o grupo, numa competição importante.
– Fale da importância dessa sequência de bons resultados do Clube do Mé Futebol Clube…
– Importantíssimo. Mas só chegamos a isso graças à participação importante do torcedor, apoiando nos momentos importantes, lotando o estádios em rodadas importantes, nos colocando nessa posição importante na tabela do campeonato.
– E quarta-feira tem um jogo importante…
– Por isso é importante a gente descansar bem amanhã, importantíssimo treinar bem na terça, porque é importante chegarmos bem preparados na próxima rodada.
– Tá aí o Lucas Fulano, jogador importantíssimo em mais uma vitória importante do Clube do Mé”.

É assim: em rádio e TV, nada mais – rá! – importante que o tempo. Então, só fale o que for… importante. Se não tiver importância, não diga.
Se você está dizendo aquilo, é importante – porque você não fala bobagem, não perde tempo com besteira, não enche linguiça.

Não precisa contar por ouvinte/telespectador que aquilo é importante. Se precisa explicar que tal coisa é importante, deve ser porque ela não importa pra ninguém nem pra nada.

Ou você troca a palavra por outra, que realmente informe alguma coisa, ou – melhor ainda – não qualifique, não adjetive. Só conte a importantíssima coisa que o David Fulano fez pelo Clube do Mé Futebol Clube.

Falar de improviso é uma coisa importante, meu caro.
Mas é importante treinar muito antes, no chuveiro, segurando o xampu igual microfone.
Importantíssimo.

Na RD Congo, estupro é arma de guerra

 

E a ONU anuncia a prisão de um suspeito de estar envolvido nos casos de violência contra cinco mil mulheres e crianças.

Pra fugir, mulheres – e homens e crianças – vagam pela África, pelos campos de refugiados.

Conhecer um é ir a outro mundo, dentro do nosso.

Veja como eles são aqui, na reportagem da TV Brasil.

Pra saber mais, leia os textos que escrevi sobre o assunto clicando aqui.

No Congo, a dura volta para casa

Duas reportagens publicadas em conjunto, na Agência Brasil.

Aproveitei os dados mais recentes para contar detalhes da visita que fiz ao campo de refugiados de Gihembe, durante minha viagem a Ruanda (veja o post que escrevi na época clicando aqui).

Por esses dias vamos editar um especial para a TV Brasil. Será um programa Caminhos da Reportagem que falará de Ruanda como um todo. Se der tudo certo na edição (que dá um trabalho miserável – aqui e no Brasil), ele será exibido em novembro.

Estevão de Abreu faz imagens para a TV Brasil. As crianças observam tudo bem de perto.

22/09/2010
Aos poucos, refugiados da guerra civil do Congo voltam para casa

Eduardo Castro
Correspondente da EBC para a África

Maputo (Moçambique) – Mais de 210 mil refugiados congoleses conseguiram retornar ao país natal desde 2004, segundo levantamento mais recente do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados, fechado em agosto. E o número será maior no fim de setembro. Só na semana passada, mais de 4 mil refugiados deixaram a cidade de Zemio, na República Centro-Africana, e voltaram ao Congo.

Outro movimento parecido foi registrado na região congolesa de Katanga, para onde regressaram, até o dia 18, 846 pessoas provenientes de Zâmbia, de acordo com boletim do Escritório de Coordenação de Assuntos Humanitários da Organização das Nações Unidas (ONU) no país.

Por outro lado, mais de 1,1 mil pessoas fugiram de suas casas na mesma área, depois de três ataques do Exército congolês a grupos rebeldes. E o retorno de moradores do território de Beni foi suspenso por causa de operações militares contra guerrilheiros ugandenses.

Idas e vindas são comuns na região central da África, onde campos de refugiados surgem e desaparecem de acordo com a intensidade das batalhas. Por causa da guerra civil – responsável pela morte de cerca de 5 milhões de pessoas em 15 anos – a estimativa é de que 1,5 milhão de congoleses vivam espalhados em campos de refugiados montados nos países vizinhos, como Uganda, Ruanda, Angola, Burundi, Tanzânia e Moçambique.

A República Democrática do Congo tem 62 milhões de habitantes e ocupa o sexto lugar entre os piores índices de desenvolvimento humano (IDH) do mundo, segundo a ONU, mesmo sendo rica em diamantes, ouro, petróleo e outros recursos minerais. Uma sucessão de conflitos motivados por interesses políticos, étnicos e econômicos convulsiona o país, que chamava-se Zaire até 1997. Uma missão de paz da ONU (identificada pela sigla Monusco) atua no Congo desde 1999 para acompanhar acordos de cessar-fogo entre grupos rivais, nunca integralmente cumprido.

No começo do mês, o Exército congolês reforçou a atuação em Walikale, depois da denúncia que grupos rebeldes passaram a estuprar mulheres e crianças na região. Para enfraquecer os guerrilheiros, o governo decidiu fechar minas nas áreas do Kivu Norte, Kivu Sul e Maniema. Observadores internacionais acreditam que, apesar de melhorar a segurança na região, a medida pode gerar ainda mais miséria, pois o garimpo é praticamente a única atividade econômica que oferece oportunidade de trabalho para milhares de congoleses.

Em Ruanda, refugiados congoleses estão seguros, mas querem voltar para casa

Eduardo Castro
Correspondente da EBC para a África

Maputo (Moçambique) – A Agência Brasil visitou Gihembi, em agosto, um dos campos de refugiados que recebem congoleses em Ruanda. Localizado a 50 quilômetros (km) da fronteira com a Uganda e a 200 km do Congo, Gihembi foi criado em 1996 como solução temporária para receber congoleses que fugiam da guerra civil. Transformou-se em uma cidade de 20 mil habitantes, na maioria membros das etnias banyamulenge e banyamasisi, ligadas aos tutsi ruandeses.

Nos 60 km que separam o campo de refugiados da capital ruandesa Kigali é possível ver plantações de banana e arroz. A estrada é estreita e sinuosa, mas inteiramente asfaltada e sem buracos. Depois de uma hora e meia de viagem surgem casas de taipa enfileiradas nas encostas da colina mais alta da região. Na entrada de Gihembi não há cancelas ou portões. Uma corrente separa o campo da pequena cidade de Byumba. Os refugiados podem circular apenas pela vila. Para ir mais adiante, precisam de autorização do serviço de imigração ruandês. Para facilitar as idas e vindas, cartões de identificação devem ser distribuídos.

O campo também tem uma escola primária – que atende a 4 mil alunos – feita de paredes de barro e telhado de zinco coberto de poeira marrom. Assim também são todas as casas, erguidas pelos próprios moradores. Muito plástico, pedaços de zinco e tábuas dominam o cenário geral. O chão é de terra batida. Há torneiras pelo campo, onde os moradores buscam água em baldes e garrafões. As construções são mais sólidas do que as barracas de lona vistas em outros campos de refugiados da África Central.

Em uma área fechada por cercas de caniço há salas de consulta médica e atendimento psicológico, onde um médico e cinco enfermeiras recebem os doentes. Casos graves são encaminhados à cidade. Também está instalada uma farmácia, que distribui os medicamentos receitados, inclusive para aids, muito comum em toda a região. Só no campo de refugiados, 248 pessoas estão em tratamento contra a aids.

Anemia a carência nutricional em adultos são casos comuns. Ao lado dos consultórios, uma cozinha com fogões de lenha reforça a alimentação de 148 crianças desnutridas. Lactantes (300) e mulheres grávidas (86) também recebem complemento alimentar. Cada refugiado tem direito a 2.200 calorias por dia. Arroz, milho, feijão e óleo são distribuídos uma vez por mês.

No dia que a equipe da EBC visitou o campo de refugiados de Gihembi, em agosto, era dia de distribuição do suprimento de lenha, que deve durar dois meses. A distribuição é feita em uma praça central, onde também estão montadas bancas de frutas e verduras. A movimentação é intensa. Centenas de mulheres e crianças subiam as ruas de terra com toras de madeira equilibradas na cabeça.

As mulheres, maioria visível em Gihembi, vestem panos coloridos amarrados na cintura e na cabeça. Fogem da câmera, assim como os homens mais velhos. Alguns vestem roupas com marcas conhecidas – piratas ou verdadeiras, vindas de doações distribuídas por toda África.

Já as crianças mostram-se curiosas com os visitantes. Sorridentes, fazem poses para a câmera e puxam o repórter pelo braço. Gritam “muzungu, muzungu” (“branco, branco” em kinyarwanda, língua predominante na região) e acompanham de perto o trabalho do cinegrafista da TV Brasil. A maioria fala ou, ao menos, entende francês. E na escola ensina-se inglês. São muitos cumprimentos de “good morning, muzungu (bom dia, branco)”.

Elas correm pelas ladeiras de terra, jogam basquete em uma quadra perto da entrada do campo. Também gostam de futebol. Adolescentes mais arredios aproximam-se ao ver a bandeira verde-amarela no colete da TV Brasil. E tentam se comunicar enfileirando nomes de jogadores brasileiros – alguns com sobrenome: “Kaká, Robinho, Ramires, Ronaldo Nazário de Lima”.

Como a vila vizinha é pequena, poucas são as oportunidades de emprego – tanto para ruandeses quanto para refugiados. Por isso, poucos congoleses vão à cidade. Além das barracas de frutas e verduras, pequenos comércios vendem refrigerante e crédito para telefone celular pré-pago, além de algumas poucas conveniências.

Alguns refugiados conseguem dinheiro (pouco) fazendo melhorias nas casas dos vizinhos. As enfermeiras também são moradoras e recebem uma pequena contribuição pelo trabalho, bem como os professores. Segundo os moradores, há gente com diploma que vive ali, sem perspectiva, esperando há anos para poder voltar para casa. O máximo que consegue é dar aulas na escola primária.

“Aqui estamos totalmente seguros”, diz Gerard Damascene Toma, um dos indicados pelos representares do governo de Ruanda e das Nações Unidas para falar com a Agência Brasil. “Fomos expulsos de nossa terra pela guerra. Espero pelo acordo de paz para retornar e ver o que sobrou”, afirma ele, que vive desde dezembro de 1998 em Gihembe. “Não é bom, mas é melhor que lá”.

Jean Paul está no campo desde 1997, quando conseguiu escapar da República Democrática do Congo. No campo de refugiados, se sente em segurança. Mas não pensa em ficar. “Não podemos estar satisfeitos. Recebemos comida e abrigo, mas queremos voltar para nossos lugares.”

Edição: Vinicius Doria

Muzungu verde-amarelo

Campo de refugiados de Gihembe, fronteira entre Ruanda e Uganda. Vivem ali cerca de 20 mil pessoas, todos congoleses que fogem da guerrilha. Perto de outros campos do gênero, com barracas de lona e pedaços de zinco, é bem montado: tem escolas e casas de taipa, distribuição regular de comida. Mas é um campo de refugiados. Não é um camping.

Não há luz regular ou água encanada. Hoje, quando visitei o lugar, era um dia muito esperado: o da distribuição de lenha. Muitas senhoras e crianças carregando na cabeça, pedaço por pedaço, o combustível que vai aquecer a casa e a comida pelos próximos dois meses.

Você vai conhecer o campo muito em breve, no Caminhos da Reportagem, da TV Brasil.

Por enquanto, só pra dar vontade de ver, mais um detalhezinho: “muzungu”, em kinyarwarda, quer dizer “branco”, homem branco (no sul de Moçambique é “mulungu”). E a garotada neste campo está aprendendo inglês. Daí eu ter ouvido tanto “godo morning, muzungu”, ao longo de toda a tarde.

Outra coisa que é bem marcante é o sorriso das crianças – mesmo sem ter a mínima idéia do que seja um Playstation. Sorriem só por você estar lá. Tocam em você. Cantam pra você. Eu não estava vestido de Papai Noel. Nem dei dinheiro a ninguém.

Meu antecessor cá em África, Carlos Alberto Junior, escreveu sobre isso lindamente uma vez. Recomendo dar uma olhada, clicando aqui.

Mas algo que o muzungu trazia colado no colete o tornava ainda mais interessante: a bandeira do Brasil.

Daí os jovens também se interessavam em falar comigo. Num papo que juntava inglês e português do muzungu, francês e kinyarwarda deles. E, claro, a língua comum: o futebol.

Vai estar tudo na reportagem – vocês vão ver.

Fim do primeiro ato.

Segundo ato: sala do representante do Banco Africano de Desenvolvimento em Kigali.

Jacob Diko Makete é da República dos Camarões, PhD em nãoseioqueconomics pela London School of Economics, formado em Cambridge, príncipe de um clã (ele não falou; descobri na internet) e admirador queixocaidístico da melhoria econômica brasileira dos últimos anos, da independência da política interna e da atenção que o país dá, agora, para a África.

E ele nem ensaiou discurso ou estudo pra me impressionar – cheguei sem avisar. “Quero falar com alguém aí no Banco”, disse pro guarda. “D’accord”, respondeu ele, deixando claro que não tinha entendido nada. Abriu o portão e eu subi. Por acaso – era feriado – o chefe estava. Ficou fascinado com a TV Brasil estar aqui em Ruanda, e, especial, ali, na sala dele.

Falamos por quase uma hora (ele não quis gravar, veja bem! Estou insistindo ainda). No meio do papo, me veio à cabeça uma conversa que tive com o ministro Ney Bittencourt, da embaixada brasileira em Maputo, logo que cheguei. Ele foi o primeiro representante brasileiro em uma reunião da União Africana. E contou que, além de alegria e certo espanto em vê-lo ali, os representares dos outros países olhavam pra ele com aquela cara de “que bom que você finalmente veio.”

É assim que tenho me sentido inúmeras vezes no exterior – e em especial aqui na África – só pelo fato de ter nascido em algum lugar entre os pampas e os seringais. Uma mistura de surpresa com carinho, admiração com inveja boa.

Nunca fui de arrotar patriotismo ou sair elogiando o gingado, o tempero, a malemolência e o veneno da brasilidade. Até porque é o jactar-se disso que nos fez – até agora – muito reconhecidos pelo rebolar de nossos quadris e a qualidade da nossa depilação íntima (chamado, em vários países, de “brazilian wax”).

Não é mais só o futebol que nos faz objeto de admiração aqui fora.

Está mudando. E eu tô curtindo.

E, como todo dia, CPLP

Sandra posta lá no Mosanblog, e eu replico cá, pá.

Ó, veja como foi…

Veja o restante do Mosanblog também… toda quinta-feira tem música africana. E muita historieta sobre nossa vida aqui.

Mais goooooooooooooooooooooooooooollllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllll

Lembra do goooooooooooooooolllllllllllllllllllllllllllllll de Españaaaaaaaaaaaaaa que eu postei aqui no começo da Copa? (clique aqui pra ouvir de novo).

Então você pode imaginar como foi o de ontem…

Tá aqui.

Narração da Cadena Cope.

A grana, sempre ela.

Mal vi a seleção aqui. Como sempre aconteceu nas copas que cobri, sou eu de um lado e ela do outro.

Mas a gente tem amigos, né?

Um deles me contou que o time (a “rapaziada” ou “boleirada”, como diz o reportariado íntimo), no geral, ficou bem pau da vida com o Dunga e o Jorginho por causa da reclusão.

Mas não queriam “liberdade, liberdade”, comunicar-se diretamente com o distinto público ou fazer farra só. Até porque, neste grupo aí, o mais provável seria querer ir à igreja.

Eles queriam expor os patrocinadores pessoais.

Além dos básicos e manjados bonés e camisetas, queriam mostrar o tênis, os óculos de sol, o brinco, o colar, a roupa de ir pra… igreja.

Eles apareceram muito pouco, e só de uniforme.

Os milionários deixaram de ganhar mais milzinho cada. E eles ficam bravos quando isso acontece.

A seleção vai mudar. Mas quando será a nossa vez?

Sempre que o Brasil é desclassificado da Copa, a pauta é “enumerar os inúmeros erros” que foram cometidos na convocação, preparação, escalação, alimentação, e qualquer outro “ão” que caiba no processo. Em seguida, apontar o que deve ser feito para que esses erros não se repitam na próxima copa.

Mas quem diz que esses erros aconteceram mesmo? Será que não é possível que tudo tenha sido feito certo e – miraculosamente – algum outro time tenha sido melhor que o nosso?

“Ouvimos as fontes”, dizemos nós. Quais fontes, só pra lembrar? O processo é o mesmo que se usa pra analisar – imparcialmente, é óbvio – decisão de Banco Central ou Ministério da Fazenda: gente “de mercado”, ex-integrantes da instituição ou “comentaristas experientes”. Na enorme maioira das vezes, sempre os mesmos, que já sabemos que vão falar exatamente o que queremos escutar.

Mas daí não é a minha opinião, né? É o que o Mailson da Nóbrega acha.

Sem falar nessa esquizofrenia entre departamento comercial e conteúdo. Enquanto as chamadas são carregadas de emoção e apelos patrióticos, e os comerciais são de um ufanismo só, prafrentebrasilsalveaseleção, a moçada na beira do campo quer provar que é “jornalismo futebol clube”, imparcial, sem pachequismo. Só que sendo contra tudo – tudo – o que os caras fazem. Como se isso não fosse parcial também. Não fosse erro. Ou soberba de achar que do lado de lá só tem mané.

Lembro sempre dos famosos comentaristas que dizem que “o próprio nome da FIFA já diz que futebol é association”, pra indicar que tal time deveria jogar em conjunto. Um sujeito que diz isso deveria ser pendurado de cabeça pra baixo. “Fédération Internationale de Football Association” quer dizer Federação Internacional de Associações de Futebol. Nunca foi “Federação Internacional de Futebol Associado”.

Bom seria que, a cada quatro anos, a imprensa também passasse pelo mesmo escrutínio rigoroso que impõe à seleção. Daí, certamente, os imaturos e ou preguiçosos não viriam nas próximas. Quem previu o futuro e errou feio – ou ficou no muro de sempre – seria obrigado e estudar mais antes de abrir a boca. E quem se mostrou ultrapassado, preconceituoso ou anacrônico passaria a comentar só jogo de showbol. Se tanto.

Mas não. Nós não erramos nunca. Nem vamos a lém da conta. “Como? Campanha contra alguém? Imagine! Só reportamos fatos como eles são e fazemos críticas necessárias. Sempre construtivas, é claro”.

Quantos analistas te contaram como a seleção da Alemanha viria jogar na Copa? Qual o grande diferencial dela? Quantos apontaram a Alemanha como favoritíssima ao título? Claro que não vale aquele troço de “a Alemanha é sempre candidata em qualquer competição.”

Mas fomos várias vezes informados quantos jogos o Zéninguémkovic fez pela segunda divisão da Eslováquia, ou qual o nome da quarta ex-esposa – modelo, por sinal – do craque Bonítolson, que assinou um contrato milionário com aquela famosa grife de botinas Pedeboy.

Desnecessário dizer que tem gente no nosso meio que sabe o que fala, conhece tática, batalha por notícia e não por fofoca, não quer nem o lugar do técnico nem do supervisor da seleção. Claro que tem. Também tem quem apontou a Alemanha como favorito sim. Mas esses tem que ser a maioria. E ainda não são.

É claro que a seleção erra. Mas agora vai trocar técnico, cair comissão, modificar “filosofia”, como tanto gostamos de dizer.

E nós? Quando vamos mudar de tática?