Líbia também?

E então? O dominó segue ou não segue.

Eu não me arrisco. Os especialistas que opinem.

Clicando aqui, você assiste à reportagem da TV Brasil.

17/02/2011
Protestos na Líbia têm forte componente político, diz acadêmico africano

Eduardo Castro
Correspondente da EBC na África

Maputo (Moçambique) – Relatos passados pelas redes sociais na internet informam que pelos menos 14 pessoas foram presas hoje (17) durante manifestações contra o governo da Líbia em Benghazi, a segunda cidade mais populosa do país africano. Os protestos do chamado Dia da Ira foram convocados depois dos conflitos de ontem entre manifestantes oposicionistas e as forças de segurança do governo de Muammar Kadhafi, no poder há 42 anos.

De acordo com a página oposicionista Libya Al-Youm, pelo menos quatro pessoas morreram na quarta-feira (16), na cidade de Baida. Segundo a Agência Lusa, de Portugal, o número de mortos nas quatro principais cidades líbias, incluindo a capital Trípoli, chega a 14.

Para defender o governo, centenas de apoiadores do presidente Muammar Kadhafi saíram às ruas de Tripoli, em uma contraposição às manifestações de Benghazi.

Para o doutor em conflitos africanos Ali Jamal, do Instituto Superior de Relações Internacionais de Moçambique, o cenário dos protestos é o mesmo: Norte da África, países árabes majoritariamente muçulmanos, grandes massas populares empobrecidas e governos autoritários instalados há décadas. “Nesses países há o multipartidarismo de disfarce que, de fato, é um regime de monopartidarismo brutal. Sabemos que as pessoas não têm liberdade de se manifestar.”

Entretanto, segundo Jamal, Tunísia, Egito e Líbia vivem situações diferentes. “Na Tunísia, o grande motivador foi econômico. No Egito, como o governo cedeu, os egípcios sentiram-se fortes para pedir a queda do presidente [Hosni] Mubarak, já com um forte componente político no protesto”.

“Na Líbia, a questão é mais política”, disse o professor. “Muitos dos serviços públicos e benefícios sociais são subsidiados. É um país com uma economia mais estável e muito mais riqueza que alguns vizinhos”. De acordo com o acadêmico, é difícil prever até onde vai a força dos protestos. “O carisma de Muammar Kadhafi é muito grande, apesar de tanto tempo [no poder] e da falta de liberdade política”.

Edição: Vinicius Doria

Costa do Marfim na TV Brasil

São duas reportagens – de segunda-feira, dia 20 de dezembro, e de terça-feira, 4 de janeiro – com as opiniões de especialistas africanos sobre a África.

Dificilmente vemos isso. No geral é americano, sueco, português inglês, e até brasileiro falando sobre o que eles acham que vai acontecer aqui.

Ressalto que a professora Iraê nasceu, sim, no Brasil. Mas está aqui há 30 anos e é cidadã moçambicana. Segundo ela, foi uma das brasileiras que “o Brasil não quis”.

Foi mais uma que, menina, foi torturada pela ditadura militar. Cumpriu pena e deixou o país. Perdeu até a cidadania. E emocionou-se no sábado, ao ver alguém com história de vida parecida com a dela com a faixa no ombro.

Clicando aqui, você vê a do dia 20.

E clicando aqui, a do dia 4.

Vai ter guerra de novo da Costa do Marfim? Depende, diz quem sabe

Depende de Laurent Gbagbo e do jeito que o tratarem. Ouvi isso de dois especialistas em conflito e negociações na África. Um bem longe do outro, aliás.

As entrevistas renderam bem mais que a reportagem que está ai embaixo. Vou publicar outras nos próximos dias, sobre Sudão e eleições na África em que eles vão aparecer de novo.

Em breve.

04/01/2011
Líderes africanos e acadêmicos defendem solução negociada para crise na Costa do Marfim

Eduardo Castro
Correspondente da EBC na África

Maputo (Moçambique) – Laurent Gbagbo não pretende deixar o poder na Costa do Marfim. A posição de Gbabo ficou clara para a comissão que representa a União Africana e a Comunidade Econômica da África Ocidental (Ecowas, na sigla em inglês) nas negociações em torno do impasse criado pelo resultado das eleições marfinesas. A comunidade internacional não aceita a permanência de Gbabo na presidência e exige que o oposicionista Alassane Ouattarra assuma o poder, respeitando o resultado das últimas eleições presidenciais.

“Nesse momento, podemos dizer apenas que as discussões prosseguem”, afirmou o presidente de Serra Leoa, Ernest Bai Koroma, citado pelas agências internacionais. Junto com ele, Pedro Pires, de Cabo Verde, Bon Yayi, do Benim, e o primeiro-ministro do Quênia, Rayla Odinga, mantiveram em Abdijan (maior cidade marfinesa) reuniões com os dois protagonistas da crise, Gbagbo e Ouattarra.

Em 28 de novembro do ano passado, Gbagbo e Ouattarra – opositores políticos e de etnias diferentes – concorreram na primeira eleição presidencial da Costa do Marfim em dez anos. A oposição foi declarada vencedora pela Comissão Eleitoral. Mas a Corte Suprema do país reviu os números, alegando fraude, e deu a vitória ao presidente Gbabo.

As Nações Unidas (ONU), a Ecowas, a União Africana e outros organismos multilaterais, além de vários países individualmente, acusam Gbabo de subverter a vontade popular ao permanecer no poder. Apoiadores de Gbagbo, porém, alegam que ele foi legitimamente reeleito e que a decisão da Corte Suprema é soberana, independente e está de acordo com a Constituição do país.

Foi a segunda vez que o grupo de líderes africanos esteve com os dois lados em litígio, em mais uma tentativa de evitar a repetição da guerra civil que, em 2002, confrontou o Norte e o Sul do país, depois de uma tentativa de golpe de Estado. A ONU estima que, desde o segundo turno das eleições, mais de 200 marfinenses morreram em choques entre grupos rivais.

As palavras de Ernest Bai Koroma indicam que, apesar de a Ecowas já ter anunciado que poderá usar “força legítima” para fazer valer o que considera ser o resultado legal das urnas, ainda há espaço para a negociação. Para especialistas em política africana ouvidos pela Agência Brasil, a negociação ainda é um caminho possível de ser trilhado.

“Nessa altura, ainda é possível termos uma solução, desde que o presidente Gbagbo não se sinta totalmente desprezado em termos políticos”, afirmou o moçambicano Aly Jamal, doutor em relações internacionais especializado em conflitos africanos. “Ele [Gbabo] precisa de alguma forma de proteção ou imunidade. Não se pode, agora, confrontá-lo com a possibilidade de levá-lo a um tribunal internacional se queremos preservar uma situação fora da guerra”, disse Jamal.

Para Aly Jamal, ainda que reter o poder depois de eventualmente perder uma eleição seja um ato inaceitável e contrário às regras democráticas, o momento histórico pelo qual passa a Costa do Marfim deve ser levado em conta nas negociações. “É necessário entender que o que se passa na Costa do Marfim não é a transferência de poder de uma democracia consolidada”, alerta o professor. “É a tentativa, também, de se por um fim a uma situação de conflito, que é muito recente.”

A professor Iraê Baptista Lundin, chefe do Departamento de Estudos Sociopolíticos e Culturais do Instituto Superior de Relações Internacionais de Moçambique, concorda com o colega de academia, mas aponta um problema: o que fazer com Gbabo, se ele deixar o poder. “O problema da alternância política na África ainda é complexo e está ligado a não haver, ainda, na maior parte dos países, um lugar de destaque para o ex-governante”, explicou ela. “Ou está no governo ou está numa situação difícil, muitas vezes com sua vida em perigo.”

A professora Iraê Lundin participou do grupo que negociou a paz em Moçambique, entre 1992 e 1994, depois de 16 anos de guerra civil. Ela defende uma saída parecida para a Costa do Marfim. “Nós preferimos a solução mais inclusiva”, lembra. “Aqui [em Moçambique], até hoje, [o ex-líder guerrilheiro Afonso] Dlakama é líder da oposição. A África precisa caminhar para soluções com a cultura da África, que é a cultura da integração, da transformação.”

Nascida no Brasil, Iraê vive na África há 30 anos. Presa política na ditadura militar, ela perdeu a cidadania brasileira depois de cumprir pena em Barra do Piraí (RJ). Estudou na então União Soviética, na Suécia e fixou residência em Moçambique, onde leciona no instituto que prepara diplomatas para o país e outras nações africanas.

Edição: Vinicius Doria