Poder, exílio ou mausoléu.

Reportagem exibida no Reporter Brasil, sobre o que chamei de A Difícil Hora de Dizer Adeus, no post anterior.

Clique aqui para assistir.

Amanhã, sexta-feira, encerro minha cobertura (ao menos por enquanto) dos eventos no Egito.
Embarco para o Senegal, onde vou acompanhar o Fórum Social Mundial.

Por causa da viagem, meu passaporte ficou a semana passada e parte desta na embaixada do Senegal em Pretória, África do Sul, para receber o visto. Não fosse isso, teria embarcado para o Cairo, provavelmente.

E seria eu – e não os meus colegas Corban Costa e Gilvan Alves Rocha- quem teria passado pela exasperante situação que eles passaram, sendo tratados como criminosos por tentar ingressar no Egito para apenas fazer reportagens e contar a verdade.

Criminosa é a ditadura – a de Mubarak e qualquer outra.

Corban e Gilvan já estão bem, a caminho do Brasil, onde há liberdade de expressão – ao contrário do que querem crer alguns coleguinhas que precisam conhecer melhor o mundo.

Tenho lido muita bobagem na imprensa brasileira. De certa forma, prova de que se publica o que se bem quer. Muitas vezes, que mal se entende.

Um abraço ao Corban e ao Gil, parceiros de outras tantas.

A difícil hora de dizer adeus

Tchau poder, amigos de ocasião, helicóptero, sorrisos desinteressados e puxa-sacos de plantão.

Para alguns, o adeus inclui despedidas ao constante fluxo de grana entrando na conta da Suíça, Ilhas Cayman ou similares igualmente discretos.

Mas, aqui na África, deixar o cargo é correr perigo.

Veja aí embaixo.

02/02/2011
Mubarak rejeita transição e violência toma conta dos protestos no Egito

Eduardo Castro
Correspondente da EBC na África

Maputo (Moçambique) – Grupos pró e contra o presidente do Egito, Hozny Mubarak, se enfrentaram com pedras e tiros na tarde de hoje (2), no Cairo. Até cavalos e camelos foram usados pelos manifestantes que transformaram em campo de batalha a Praça Tahrir, que tem sido o palco das maiores manifestações conta Mubarak. O exército acompanhou o confronto praticamente sem intervir. Quando começou o período do toque de recolher, bombas de gás foram atiradas para dispersar a multidão. Várias pessoas ficaram feridas.

De acordo os manifestantes, o grupo favorável ao governo age a mando do presidente Mubarak, para tentar aterrorizar a população e diminuir a pressão popular pela sua saída. Na tentativa de retomar o controle das ruas, Mubarak anunciou ontem que não vai concorrer a um novo mandato nas eleições presidenciais marcadas para setembro.

Hoje, a oposição repetiu que quer Mubarak fora do poder e do país até sexta-feira (4). Um dos principais líderes da oposição, o prêmio Nobel da Paz Mohamed Elbaradei, chamou o posicionamento do presidente de “um truque” para manter-se no cargo.

Sem o apoio que esperava – do exército ou da comunidade internacional – Mubarak hoje ouviu do secretário-geral das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon, que é “inaceitável” um ataque aos manifestantes pacíficos. “Estou profundamente preocupado com a violência contínua no Egito”, declarou Ban Ki-moon, que está em Londres.

O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, afirmou ser “significativo que haja uma transição ordeira, que deve ser pacífica e começar agora”. Mas o governo egípcio não aceita iniciar um processo de transferência de poder neste momento.

Líderes africanos costumam ser exageradamente resistentes na defesa dos próprios poderes, mesmo quando fica evidente que o período de poder está no fim. Para a professora Iraê Lundim, doutora em relações internacionais, isso ocorre porque pouquíssimos são os países que, em termos institucionais ou até culturais, reservam um lugar específico para seus ex-líderes, sejam eles bons ou ruins.

“É uma constatação”, diz ela, que participou do grupo que, em 1994, negociou a paz em Moçambique, processo que pôs fim a uma guerra civil de 16 anos. “Isso faz com que nossas transições, em bom número, sejam muito conflituosas. Como regra geral, ou você está no poder, ou no exílio, ou no mausoléu”, diz Iraê. Segundo ela, perder o cargo representa muito mais do que deixar de ter uma fonte de renda (honesta ou não), de exercer o poder ou de viver o “fausto de ser um líder”. Muitas vezes, é uma questão de sobrevivência.

A professora lembra que, em outros países, o quadro é diferente. Nos Estados Unidos, por exemplo, o presidente Richard Nixon renunciou em 1974, acusado de mentir para o país e sob risco de sofrer processo de impeachment, no escândalo conhecido como Caso Watergate. Entretanto, depois de afastado do cargo, acabou sendo formalmente perdoado pelo sucessor, Gerald Ford, e teve seguidores e adversários até a morte.

No Brasil, o ex-presidente Fernando Collor chegou a ser formalmente afastado do poder após um processo de impeachment, cumpriu a pena política e voltou à vida pública em um cargo eletivo, de senador por Alagoas. “Não estou tentando justificar esse apego todo”, diz a professora Iraê. “Mas é importante entender porque eles [os ditadores] resistem tão enormemente.”

Edição: Vinicius Doria

Costa do Marfim na TV Brasil

São duas reportagens – de segunda-feira, dia 20 de dezembro, e de terça-feira, 4 de janeiro – com as opiniões de especialistas africanos sobre a África.

Dificilmente vemos isso. No geral é americano, sueco, português inglês, e até brasileiro falando sobre o que eles acham que vai acontecer aqui.

Ressalto que a professora Iraê nasceu, sim, no Brasil. Mas está aqui há 30 anos e é cidadã moçambicana. Segundo ela, foi uma das brasileiras que “o Brasil não quis”.

Foi mais uma que, menina, foi torturada pela ditadura militar. Cumpriu pena e deixou o país. Perdeu até a cidadania. E emocionou-se no sábado, ao ver alguém com história de vida parecida com a dela com a faixa no ombro.

Clicando aqui, você vê a do dia 20.

E clicando aqui, a do dia 4.