Tunísia: o povo não é bobo

Fingimus que fumus e vortemus…

Ói nóis aqui tra veiz!

Os ministros – rá! – cantaram primeiro.
Os manifestantes cantaram em seguida.

Reportagem da Agência Brasil.

18/01/2011
Novo governo da Tunísia não desperta confiança e manifestantes voltam a protestar em Túnis

Eduardo Castro
Correspondente da EBC na África

Maputo (Moçambique) – Mesmo depois da queda do presidente Zine El Abidine Ben Ali, novos protestos levaram milhares de pessoas às ruas da capital da Tunísia, Túnis, nesta terça-feira (18). Os manifestantes não concordam com a composição do governo de transição, anunciada ontem (17), que manteve aliados do ex-presidente em postos-chave da administração pública. A polícia usou bombas de gás lacrimogênio, cassetetes e escudos para dispersar os protestos.

Na segunda-feira (17), o primeiro-ministro, Mohammed Ghannouchi, anunciou a composição de um governo de coalisão para conduzir o país até as próximas eleições, daqui a seis meses. Ele manteve-se no cargo, bem como os titulares dos ministérios do Interior, Relações Exteriores e Defesa. Três líderes oposicionistas foram indicados para as pastas da Educação Superior, Saúde e Desenvolvimento.

Entretanto, três dos indicados a ministro já desistiram dos cargos, depois que a maior central sindical do país, União Geral dos Trabalhadores da Tunísia (UGTT), decidiu não reconhecer o novo governo.

O ex-presidente Ben Ali deixou o poder na sexta-feira (14), ao fugir do país para refugiar-se na Arábia Saudita. Ele presidia a Tunísia desde 1987. Depois da queda de Ben Ali, o governo do primeiro-ministro Ghannouchi tenta manter-se no poder prometendo reformas econômicas e políticas, legalização de partidos, supressão da censura e libertação de presos políticos. Hoje (17), desembarcou em Tunis o líder exilado Moncef Marzouki, que passou os últimos 20 anos em Paris. O partido dele foi banido durante o regime de Ben Ali.

Há cerca de um mês, estudantes, profissionais liberais e desempregados iniciaram uma onda de protestos contra os altos índices de desemprego e a subida repentina dos preços no país. Mobilizados pela internet, os protestos logo voltaram-se contra a falta de liberdade de expressão. O governo confirmou que 78 pessos morreram durante as manifestações.

Os analistas acham difícil que a onda de manifestações tunisina inspire movimentos semelhantes em outros países africanos. Mesmo os governados por regimes autoritários. “Já tivemos o caso da Argélia, com violência nas ruas. Agora temos a Tunísia, e algum movimento também no Egito”, diz Aly Jamal, doutor em relações internacionais e especialista em conflitos africanos, do Instituto Superior de Relações Internacionais de Moçambique. “Mas cada país tem sua especificidade”.

Ele lembra que, em outras ocasiões, o Egito passou por pressões populares e Hosny Mubarak, presidente desde 1981, soube equilibrar as tensões. “Vai ser uma correria para reduzir os níveis de dificuldades do dia a dia”, disse ele. “E, eventualmente, evitar que a situação atinja o nível de explosão.”

Edição: Vinicius Doria

Tunísia: a luta continua

O povo bravo com o governo. Será que espalha?

Reportagem da TV Brasil, exibida no telejornal Repórter Brasil (que eu orgulhosamente ajudei a criar. Fecha momento de auto-celebração).

A apresentação é da Fernanda Isidoro.

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A Tunísia e a Revolução Facebook

É impossível dizer que uma revolução ou revolta popular aconteceu por este ou aquele motivo. É sempre uma conjunção de fatores. Muitas vezes, só uma investigação detalhada, mais distante no tempo, coloca as coisas em real perspectiva.

Mas nossa geração tem pressa. Nosso jornalismo mais ainda. Já achou motivos, culpados, razões, caminhos, saídas. Pelo menos, acha que achou.

17/01/2011
Governo provisório da Tunísia nomeia ministros da oposição e liberta presos políticos

Eduardo Castro
Correspondente da EBC na África

Maputo (Moçambique) – O primeiro-ministro da Tunísia, Mohammed Ghannouchi, anunciou hoje (17) a formação de um governo de unidade nacional. Na sexta-feira (14), o presidente da Tunísia, Zine al-Abidine Ben Ali, abandonou o país depois de 23 anos no poder. Os titulares das pastas do Interior, Relações Exteriores e Defesa mantiveram os cargos, bem como o próprio primeiro-ministro, que vai liderar o gabinete até a convocação de novas eleições.

Três líderes oposicionistas foram indicados para os ministérios da Educação Superior, da Saúde e do Desenvolvimento. O governo também anunciou a libertação de presos políticos e a suspensão de qualquer restrição ao trabalho da imprensa.

Em entrevista coletiva, o primeiro-ministro disse estar comprometido em “reestabelecer a calma e a paz no coração de todos os cidadãos”, bem como fazer as reformas política e econômica.

Durante a noite, tiros foram ouvidos nas proximidades do palácio presidencial, em Cartago, segundo relatou a BBC. Soldados patrulham as ruas de Tunis e outras cidades importantes. No domingo (16), o ex-chefe da segurança presidencial foi preso, acusado de fomentar a violência.

Por causa da instabilidade política, já começa a faltar combustível nos postos do país. As filas são enormes. Os saques constantes fizeram com que moradores bloqueassem as próprias ruas com pedras e troncos de árvores para proteger as próprias casas. Há reclamações de que faltam pão e farinha nos mercados da capital. Um grupo de cidadãos suecos, que disse estar no país para caçar, foi atacado por populares porque estavam carregando armas em um táxi.

Na sexta-feira (14), o então presidente Ben Ali, que governou a Tunísia por 23 anos, abandonou o poder e buscou abrigo na Arábia Saudita. No dia seguinte, a Corte Suprema determinou que o afastamento de Ben Ali é definitivo e que novas eleições presidenciais devem ocorrer em, no máximo, 60 dias.

Durante um mês, manifestantes fizeram protestos diários em cidades do interior, contra o aumento dos preços dos alimentos e a falta de empregos. A exemplo do que aconteceu em setembro do ano passado nos protestos de rua em Maputo, Moçambique, os meios eletrônicos foram fundamentais para mobilizar a população. Em Moçambique, o veículo usado foi o telefone celular e as mensagens de SMS (sigla em inglês para serviço de mensagens curtas). Na Tunísia, o grande catalisador foram os sites de relacionamento.

Alguns tunisinos que viviam no exterior chegaram a Tunis para a grande manifestação de sexta-feira passada convocados pela rede mundial de computadores. Um deles, Mohamed Ben Hazouz, que mora em Paris, citado pela Voz da America, disse que essa foi a “primeira ciber revolução do mundo”. O movimento também é chamado nas redes sociais de Revolução de Jasmim ou Revolução Facebook.

Alguns sites também creditam às informações vazadas pelo site Wikileaks a gota que faltava para fazer transbordar a insatisfação com o governo. Os vazamentos falam em atos de corrupção atribuídos à integrantes da família do ex-presidente.

Edição: Vinicius Doria

Fome, Tunisía, Argélia, Petróleo… também na TV Brasil

Exibido no Repórter Brasil.

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Tunísia: toque de recolher. E protestos continuam

Reportagem da Agência Brasil, com alerta para Angola…

13/01/2011
Série de protestos leva Tunísia a decretar toque de recolher na capital

Eduardo Castro
Correspondente da EBC na África

Maputo (Moçambique) – Por causa da série de protestos contra o aumento de preços e o desemprego, a Tunísia decretou toque de recolher na capital do país, Túnis. A proibição de circulação vale entre as 20h e as 6h. Escolas e universidades continuam com aulas suspensas.

Mesmo com a regra em vigor, as manifestações continuaram à noite, segundo relata a BBC. A polícia voltou a agir com força. Durante o dia, alguns carros foram virados nas ruas interditadas e incendiados. O chão de algumas avenidas ficou coberto por muitas pedras, usadas para atacar a polícia, que respondia com bombas de gás.

Na tentativa de acalmar os manifestantes, o governo já havia anunciado a intenções de criar 300 mil empregos até o final de 2012 e a designação de um grupo específico para investigar denúncias de corrupção.

O número oficial de mortos chegou a 23, desde meados de dezembro, quando começaram protestos contra a alta de preços e o desemprego. Organizações civis falam em até 50 mortes. As Nações Unidas e a União Europeia manifestaram preocupação com o que chamam de “uso excessivo de força” pela polícia tunisiana. O ministro do interior, Rafik Belhaj Kacem, responsável pela polícia, foi demitido.

Na semana passada, a vizinha Argélia também passou por uma onda de protestos contra o aumento no preço dos alimentos e o desemprego. O custo da farinha e do óleo de cozinha dobraram no mês passado, atingindo preços recordes. Um quilo de açúcar saltou de 70 dinares (cerca de RS 1,50) para 150 dinares (R$ 3).

A Argélia depende vitalmente do setor energético, de onde vêm 97% do total de impostações do país. O país é integrante da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep). Dados oficiais colocam o desemprego na casa dos 10% da população economicamente ativa. Mas organizações civis apontam para um número mais alto, na casa dos 25%.

Em setembro passado, manifestações violentas paralisaram Maputo, capital moçambicana. A reclamação era contra o aumento dos preços do pão, água e energia – que posteriormente foram revogados pelo governo.

Vendo o que se passa hoje no Norte do continente, o professor moçambicano de economia Regendras de Sousa acha que a inquietação pode continuar crescendo na África. “O fato de terem buscar alimento mais caro com uma moeda americana (dólar) mais fraca faz com que esses países importam inflação”, afirma.

Com isso, diz ele, a crise atinge em cheio aos mais vulneráveis, pois muitos países africanos precisam importar até os alimentos mais básicos, até mesmo os que produzem petróleo.“Nosso vizinho irmão Angola, muito em breve, também vai se ressentir”, acredita. “A economia angolana gira em torno do petróleo e a agricultura ainda é deficiente. A subida de preços de alimentos vai lhes bater à porta.”

O professor alerta que a falta de equilíbrio das contas públicas e o inchaço vivido por Luanda (onde vive quase metade da população angolana) deve ser acompanhada de perto pelas autoridades.

Edição: Talita Cavalcante

Fome, Tunisía, Argélia, Petróleo

Me lembrou o ocorrido aqui em Maputo no começo de setembro do ano passado.

Mas há uma diferença grande no quadro: Tunísia e Argélia produzem petróleo (Argélia é parte da OPEP, inclusive). E suas populações saem à rua porque não têm o que comer.

Vou voltar ao assunto hoje na TV Brasil, Agência Brasil e, claro, aqui.

10/01/2011
Choques entre polícia e manifestantes na Tunísia causa pelo menos 14 mortes

Eduardo Castro
Correspondente da EBC na África

Maputo (Moçambique) – Pelo menos 14 pessoas morreram no fim de semana durante choques entre a polícia e manifestantes na Tunísia, no Norte da África. O número pode ser ainda maior, segundo a oposição, porque há muitos feridos. De acordo com a agência oficial TAP, vários policiais também foram atingidos nos conflitos, que foram maiores nas cidades de Kasserine, Thala e Regueb, na fronteira com a Argélia.

Manifestações não são comuns no país, presidido há 23 anos por Zine El Abidine Ben Ali. A revolta começou por causa do aumento do desemprego e da elevação no preço dos alimentos. Estudantes, advogados e professores participaram ativamente dos protestos.

No mês passado, ganhou espaço no noticiário a história de um rapaz de 26 anos que ateou fogo no próprio corpo, em protesto contra a ação da polícia, que confiscou mercadorias que ele vendia na rua. Mohammed Bouazizi, que tinha diploma universitário e não conseguia emprego, morreu por causa das queimaduras.

O ato de desespero de Bouazizi, em 17 de dezembro, acabou por tornar-se um símbolo dos manifestantes tunisianos.

Na vizinha Argélia, o aumento no preço dos alimentos também levou a protestos na semana passada. Duas pessoas morreram durante manifestações realizadas em várias cidades ao mesmo tempo. A calma voltou no domingo (9), depois de quatro dias de manifestações e choques com as forças de segurança.

Em Argel, parte do comércio ficou fechada durante os protestos e os trens pararam de circular. No sábado (8), o governo anunciou a suspensão da cobrança de impostos de importação sobre o açúcar e o óleo de cozinha, na tentativa de conter a subida dos preços.