Greve em Maputo – 2o dia, com mais polícia na rua

Acabo de voltar da rua, para mandar meus relatos para Rádio Nacional, TV Brasil e Agência Brasil.

Parte da periferia – aliás nem tão periférica assim – está tomada pela polícia.

Circulei por Maxaquene e na rua não tinha movimento. Só da polícia, de armas na mão.

O clima não é irrespirável, mas há tensão no ar. Os restos dos bloqueios estão nas pistas ainda. A população não se conforma com os aumentos dos preços.

O Conselho de Ministros vai se pronunciar daqui a pouco. Vamos ver.

Aí abaixo, a reportagem que mandei agora de manhã para a Agência Brasil.

02/09/2010
Polícia ocupa parte da periferia de Maputo para tentar conter manifestações

Eduardo Castro
Correspondente da EBC na África

Maputo (Moçambique) – A polícia de Moçambique ocupou parte da periferia de Maputo para tentar evitar a repetição das manifestações que paralisaram a cidade ontem (1º). Caminhões com bancos externos carregam policiais armados e bombas de gás lacrimogênio pelas avenidas da região de Maxaquene. Eles também apitam e disparam balas de borracha para dispersar grupos de pessoas que se aglomeram nas vielas e esquinas.

“Não queremos balas, queremos pão”, gritou uma senhora que não quis se identificar, enquanto caminhava pela avenida vazia.

Mesmo com todo o aparato, uma geladeira queimava, soltando fumaça preta, no meio da Avenida Joaquim Chissano. Ela não impedia a passagem dos carros. Havia sido posta ali por manifestantes, que voltaram a reclamar da alta do custo de vida, principalmente da água, luz e pão, cujos novos preços passaram a vigorar em setembro.

Mais uma vez não há transporte público. As vans – conhecidas como chapas 100 – não circularam de manhã. Os ônibus – os maximbombos – são poucos e vários foram danificados durante os protestos de ontem. Não há bloqueios nas pistas.

As escolas suspenderam as aulas mais uma vez. Como ontem, muita gente tenta chegar ao trabalho caminhando longas distâncias. O comércio teve dificuldades de abrir as portas e muitos estabelecimentos seguem fechados. Havia filas nas padarias, pois nem todas estavam abertas.

Fora os da polícia, poucos veículos circulavam pela Avenida Acordos de Lusaka. Nas calçadas, restos de pneus queimados ainda soltavam fumaça. A fuligem e os cacos de vidro estão espalhadas pelo asfalto. Perto dali, uma escavadeira recolhia restos de construção que foram usados ontem para bloquear a pista, durante as manifestações que deixaram quatro mortos, de acordo com a Polícia da República de Moçambique (PRM).

Tiros eram ouvidos agora de manhã e, segundo os moradores, também durante a madrugada. Falando à TV pública local, o porta-voz da PRM, Pedro Cossa, afirmou que foram casos isolados. Cossa também disse que a polícia “agiu com os meios que tem” para desobstruir as ruas. “Não somos a polícia francesa, ou a brasileira”. Ele reiterou que foram usadas balas de borracha.

Nessa quarta-feira (1º), barricadas impossibilitaram a passagem dos carros por várias avenidas de Maputo. Alguns foram incendiados. Lojas e bancos ficaram fechados. Houve saques nos mercados. Nem sequer os voos partiram do aeroporto. A Feira Internacional de Moçambique (Facim) não abriu ontem.

Houve choques com a polícia em muitos bloqueios, que resultaram na prisão de 142 pessoas. Pelas contas da PRM, 27 ficaram feridas. Mas, de acordo com a Cruz Vermelha, pelo menos 46 pessoas deram entrada com ferimentos somente no Hospital Central de Maputo.

Os protestos, sem um comando conhecido, foram convocados por mensagens enviadas para os telefones celulares. Ontem à noite, algumas circulavam felicitando a população pela greve e informando que ela deve seguir até amanhã (3).

Mais da greve em Maputo

Aprendi a usar o Twitter ( e descobri o quanto ele é poderoso como ferramenta informativa) há exatamente um ano. Estava na casa da minha mãe, em São Paulo, recém-operado.

Foi quando explodiu aquele quarteirão inteiro no ABC paulista, num incêndio que começou num depósito de fogos.

Sentado no computador, de pijama, tomando chá de doente, vi a primeira notícia… pus no Tuíte. Liguei o rádio, ouvi algo mais… pus no Tuíte.

E foi assim a tarde toda, disseminando informação e vendo o número de seguidores subir.

No princípio, os plantões da TV eram só locais pra São Paulo. A turma dos outros lugares não via nada e me mandava mensagem: “conta mais”. E eu fui contando -pra desespero da minha mãe e da minha mulher, que queriam me ver de repouso.

Tudo isso pra dizer que teria adorado ter passado o dia aqui, tuitando ou postando notícias sobre a greve e as manifestações que vi hoje aqui em Maputo.

Vi o interesse que isso despertou ao notar que minha mensagem inicial sobre o assunto teve quase mil acessos. Demais pra um blog que tem entre 100 e 200 leitores por dia (leia aqui e aqui).

Mas… eu precisava ir pra rua, ver de perto e depois contar pros leitores da Agência Brasil, ouvintes da Rádio Nacional e telespectadores da TV Brasil. Por mais que a turma queira nos depreciar, eles se contam em milhões…

É. Dessa vez eles ganharam de vocês. Aliás… por que você também não se junta a eles e acompanha meu trabalho nas emissoras públicas?

Por mais que digam que o dono delas é um só, o dono delas todas é você.

Abaixo, a atualização sobre a greve. A polícia confirmou o número de mortos.
À noite, no Repórter Brasil, você vê a reportagem na TV. Ela também vai estar aqui amanhã.

01/09/2010
Protestos em Moçambique contra alta de preços deixam quatro mortos e dezenas de feridos

Eduardo Castro
Correspondente da EBC para a África

Maputo (Moçambique) – A Polícia da República de Moçambique (PRM) confirmou que quatro pessoas morreram durante as manifestações desta quarta-feira (1º) em Maputo. A capital moçambicana praticamente parou por causa de uma série de protestos contra os aumentos dos preços do pão, da energia elétrica e da água.

Manifestantes fecharam o trânsito em várias regiões da cidade logo cedo. O transporte coletivo por vans – os chamados “chapa 100” – não funcionou. Milhares de pessoas tiveram que andar para tentar chegar ao trabalho, formando enormes filas ao longo das estradas onde poucos carros trafegavam. À tarde, o centro da cidade ficou deserto. Lojas e bancos fechados, ruas vazias, poucos carros, nenhum ônibus. As escolas mandaram as crianças de volta para casa. Segundo levantamento do jornal A Verdade, houve protestos em mais de 50 pontos da capital moçambicana.

A Embaixada do Brasil em Maputo suspendeu o expediente. E mandou uma mensagem aos brasileiros cadastrados recomendando “à comunidade brasileira evitar deslocamentos e circular pela cidade”. Também deixou um telefone de plantão (00 XX 258 82-283 53 30). Até agora não há informações de brasileiros feridos durante as manifestações.

Houve choque com a polícia em muitos dos bloqueios feitos nas avenidas da capital. Foram presas 142 pessoas. Pelas contas da PRM, 27 ficaram feridas. Mas, de acordo com a Cruz Vermelha, pelo menos 46 pessoas deram entrada com ferimentos somente no Hospital Central de Maputo. Dois são policiais.

Pelo menos oito veículos foram queimados, sendo três ônibus. Alguns carros que tentaram furar os bloqueios foram parados e incendiados pelos manifestantes. Um vagão de trem carregado de milho e 32 lojas foram saqueados. No Xiquelene, um dos maiores mercados populares da cidade, várias pessoas saíram carregando sacos amarelos de arroz e outras mercadorias. Na região do Triunfo, moradores fecharam a principal avenida do bairro com pedaços de cimento, troncos, cacos de vidro e pneus em chamas. Mesmo com muitas crianças nas pistas, a polícia tentou reprimir os protestos com bombas de gás lacrimogênio e tiros para o alto.

Segundo o porta-voz da PRM, Pedro Cossa, a polícia agiu com a firmeza que o momento pedia e usou somente balas de borracha. Mas várias pessoas deram entrada nos hospitais apresentando ferimentos que alegavam ser resultantes de disparos.

A Organização dos Trabalhadores de Moçambique (OTM) descartou qualquer envolvimento na organização dos protestos. Desde domingo, mensagens circulam nos telefones celulares convocando os moçambicanos para as paralisações. “Prepara-te para a greve geral”, diz o texto, que não tem assinatura e reclama do “preço do pão, da água e da luz”. E termina com um comando: “Desperte”.

O salário mínimo moçambicano é de cerca de R$ 120. Mas um grande número de jovens sobrevive na informalidade. Os ambulantes lotam as calçadas de Maputo, vendendo de chinelos e adaptadores de tomadas a artesanato e créditos de telefone celular.

O presidente de Moçambique, Armando Guebuza, fez um pronunciamento na televisão no início da noite. Lamentou as mortes e as depredações, que chamou de “vandalismo e destruição”. “Nossos compatriotas que são usados nesta agitação estão a contribuir para trazer luto e agravar as condições de vida dos nossos concidadãos”.

Guebuza disse que fatores externos pressionam a economia do país, mas que foram tomadas medidas para combatê-los, como os subsídios ao combustíveis e ao trigo. Afirmou que governo está implementando o plano para aumentar a produção de alimentos e intensificar a luta contra pobreza que, segundo ele, já trouxe progressos. “É participando na implementação deste programa, e não se opondo ou destruindo seu resultado, que melhoraremos nossas condições de vida”, afirmou o presidente, que encerrou o pronunciamento com um pedido à população para que tenha calma, além de “dissuadir os ingênuos, manter a vigilância e alertar as autoridades contra o que pode vir a atentar a ordem.”

Edição: Vinicius Doria

Greve em Maputo. E violência na rua

Saí para gravar sobre as manifestações. Encontrei vários bloqueios, mas as pessoas sempre nos deixaram passar por ser da imprensa.

Mas soube de carros que tentaram furar os bloqueios e foram queimados.

Estava no bairro do Triunfo e vi a polícia dispersar os manifestantes com bombas de gás e tiros para o alto. A pista estava bloqueada com paus, pedras e pneus em chamas. Ali não houve feridos.

Também vi gente saindo de Xiquelene, um mercado muito popular e muito famoso, carrengando sacos de arroz e outros produtos saqueados.

O que mais chama atenção (minha, que fique claro) é o fato da manifestação ter sido organizada por SMS. E rápido – as mensagens circularam por dois dias.

Vi algumas. Não há remetente.

Mas as rádios falam em violência. E mortes. A polícia não confirmou oficialmente nada.

Há pouco, entrei na Rádio Nacional e TV Brasil por telefone. E a Agência Brasil publicou uma reportagem, que está aí embaixo.

01/09/2010
Maputo decreta feriado por causa de protestos contra aumento de preços

Eduardo Castro
Correspondente da EBC na África

Maputo (Moçambique) – A capital moçambicana vive um feriado forçado hoje (1º) por causa de uma série de protestos contra os aumentos nos preços do pão, da energia elétrica e da água.

Manifestantes fecharam o trânsito em várias regiões da cidade nesta manhã. Alguns carros que tentaram ultrapassar os bloqueios foram queimados. O transporte coletivo por vans – o chamado chapa 100 – não funcionou desde cedo. Milhares de pessoas deslocavam-se a pé para tentar chegar ao trabalho.

Houve saques em lojas no centro da cidade e em mercados na periferia. No Xiquelene, um dos maiores mercados populares da cidade, várias pessoas saíram carregando sacos de arroz ou outras mercadorias saqueadas.

As escolas suspenderam aulas e as autoridades pediram à população que voltasse para casa.

Na região do Triunfo, moradores fecharam a principal avenida do bairro com pedaços de cimento, troncos, cacos de vidro e pneus queimados. Mesmo com muitas crianças na pista, a polícia reprimiu o protesto com bombas de gás lacrimogênio e tiros para o alto.

A mobilização foi convocada por mensagens enviadas por telefone celular. Segundo a polícia, não havia registro de oficial de realização de manifestação popular ou greve para hoje.